quinta-feira, 31 de março de 2011
quarta-feira, 23 de março de 2011
Indignação seletiva (1)
Postado por
Gabriel G;
Não tenho pretensão nem tempo de discutir a fundo a atual polêmica em torno do "blog de poesias" de Maria Bethânia e os 1,3 milhões que se quer captar para sua realização. (o blog terá 365 curta-metragens de declamações de poesias pela própria Bethânia)
Minha opinião sucinta sobre o projeto e a captação:
1. É um absurdo;
2. Não é o primeiro absurdo, nem o único, e nem de longe o pior já gerado pela política de incentivo fiscal encarnada pela Lei Rouanet, Lei do Audiovisual e demais mumunhas (criadas pelo governo FHC e mantidas pelo governo Lula);
3. A maioria das pessoas que estão a xingar por aí sabe pouquíssimo sobre o projeto de Bethânia, sobre quanto se costuma gastar em projetos culturais e sobre a história escabrosa das políticas de incentivo (o que é normal e previsível).
É simplesmente absurdo que, num país com falta de moradia, saúde e educação, o Estado custeie produções culturais de alto custo. PONTO.
Eu pararia por aqui já. Mas tem mais: mais absurdo é que o Estado custeie produções de projetos para figuras consagradas da cultura nacional; que custeie projetos elitistas que cobram ingressos caríssimos (o caso de, entre muitos outros, shows de Bethânia e de seu irmão Caetano); e muito, muito mais absurdo ainda é que cubra os gastos de marketing das empresas envolvidase e garanta o lucro destas -- cujo "desconto" em impostos pode chegar a ultrapassar 120%.
Como? Sorry? É isso mesmo: em alguns casos se você investir 200 mil reais num filme você poderia chegar a deixar de pagar ao Estado 240 mil. Pois é, além de garantir os custos integralmente o governo ainda te "pagou" 40 mil reais -- ou talvez mesmo 60 mil , se contarmos que uns 20 mil seriam os gastos de marketing de sua própria empresa! Não é uma delícia? Não é estranho que os empresários adorassem o FHC (e que muitos seguissem adorando o Lula).
Disto isso tudo, me parece extremamente sintomático o fato da indignação a respeito das políticas culturais emergir com tal força justamente quando o objeto da produção é um blog, e a arte envolvida é a poesia.
Onde estava essa indignação com a série de irrelevâncias monumentais que nosso cinema tem produzido como, digamos, O Guarani e Paixão de Jacobina? Lembrando que tais abacaxis cinematográficos custaram (e custam) muito mais que 1,3 milhões, e combraram ingresso -- enquanto, por mais questionável que seja, a produção de Bethânia será gratuita e virtualmente disponível a todos pela internet, algo muito mais condizente com um projeto financiado com dinheiro público "indireto".
Enfim: claro que é absurdo, e claro que tem um jabazão no meio. Mas não consigo reprimir a impressão de que se Maria Bethânia captasse 3 milhões para fazer um longa-metragem com ela mesma declamando poesia o quiproquó seria menor... fica um pouco difícil não ter a impressão de um subtexto: blog não é coisa séria, poesia é inútil.
Mas deve ser só pessimismo meu. (E eu nem ligo tanto assim pra poesia...)
Minha opinião sucinta sobre o projeto e a captação:
1. É um absurdo;
2. Não é o primeiro absurdo, nem o único, e nem de longe o pior já gerado pela política de incentivo fiscal encarnada pela Lei Rouanet, Lei do Audiovisual e demais mumunhas (criadas pelo governo FHC e mantidas pelo governo Lula);
3. A maioria das pessoas que estão a xingar por aí sabe pouquíssimo sobre o projeto de Bethânia, sobre quanto se costuma gastar em projetos culturais e sobre a história escabrosa das políticas de incentivo (o que é normal e previsível).
É simplesmente absurdo que, num país com falta de moradia, saúde e educação, o Estado custeie produções culturais de alto custo. PONTO.
Eu pararia por aqui já. Mas tem mais: mais absurdo é que o Estado custeie produções de projetos para figuras consagradas da cultura nacional; que custeie projetos elitistas que cobram ingressos caríssimos (o caso de, entre muitos outros, shows de Bethânia e de seu irmão Caetano); e muito, muito mais absurdo ainda é que cubra os gastos de marketing das empresas envolvidase e garanta o lucro destas -- cujo "desconto" em impostos pode chegar a ultrapassar 120%.
Como? Sorry? É isso mesmo: em alguns casos se você investir 200 mil reais num filme você poderia chegar a deixar de pagar ao Estado 240 mil. Pois é, além de garantir os custos integralmente o governo ainda te "pagou" 40 mil reais -- ou talvez mesmo 60 mil , se contarmos que uns 20 mil seriam os gastos de marketing de sua própria empresa! Não é uma delícia? Não é estranho que os empresários adorassem o FHC (e que muitos seguissem adorando o Lula).
Disto isso tudo, me parece extremamente sintomático o fato da indignação a respeito das políticas culturais emergir com tal força justamente quando o objeto da produção é um blog, e a arte envolvida é a poesia.
Onde estava essa indignação com a série de irrelevâncias monumentais que nosso cinema tem produzido como, digamos, O Guarani e Paixão de Jacobina? Lembrando que tais abacaxis cinematográficos custaram (e custam) muito mais que 1,3 milhões, e combraram ingresso -- enquanto, por mais questionável que seja, a produção de Bethânia será gratuita e virtualmente disponível a todos pela internet, algo muito mais condizente com um projeto financiado com dinheiro público "indireto".
Enfim: claro que é absurdo, e claro que tem um jabazão no meio. Mas não consigo reprimir a impressão de que se Maria Bethânia captasse 3 milhões para fazer um longa-metragem com ela mesma declamando poesia o quiproquó seria menor... fica um pouco difícil não ter a impressão de um subtexto: blog não é coisa séria, poesia é inútil.
Mas deve ser só pessimismo meu. (E eu nem ligo tanto assim pra poesia...)
domingo, 20 de março de 2011
Meu vizinho marsupial
Postado por
Marcílio, o gêmeo malvado
Faz uns 3 anos que Joshua se mudou pro apartamento vizinho ao meu. Nos conhecemos no elevador, onde trocávamos cumprimentos formais: boas noites e bons dias. Pouco tempo depois, nos vimos presos num mesmo ônibus, parado em um congestionamento e começamos uma conversa, quando descobri que Joshua era biólogo e australiano, fazendo seu pós-doc aqui no Brasil.
Interessado por biologia, logo fiquei amigo do sujeito, que me convidou pra tomar umas no seu apartamento. Entrei pela porta da cozinha e vi umas tigelas de ração no chão. Nunca havia me passado pela cabeça que o Joshua pudesse ter animais, por duas razões: estaria no Brasil apenas por uns dois anos e; nunca havia ouvido latidos, miados, trinados ou coisa parecida. Como não vi bicho algum, sentei-me no sofá e fiquei aguardando o australiano, que havia entrado na cozinha para pegar alguma coisa.
Estava muito relaxado quando senti alguma coisa peluda se movendo atrás de mim (o gato, pensei), andando sobre o encosto do sofá. Virei pra trás pra ver o bichano e...
IIIIIIIIIIAAAAAAAAARRRRRRRRGHHHHHHHHH!!!!!!!!!!!!
Saltei dali e dei uns passos pra trás, procurando alguma coisa pra acertar aquele bicho estranho:
Que merda é essa meu!?!?!?
O Joshua voltou dando risada
Esse é o Prince Charles, meu gato.
Gato?
É, um gato marsupial.
Me explicou que na Oceania, a ausência de mamíferos placentários permitiu que os marsupiais evoluíssem para ocupar todo tipo de espaço, e muitas vezes acabavam parecidos com os mamíferos placentários, por evolução convergente...bons exemplos disso são os esquilos-voadores e os esquilos-voadores marsupiais, bichos muito parecidos.
A ideia dele era que, se nós criamos os cães a partir dos lobos para fazer deles animais domésticos, o mesmo valeria para os equivalentes marsupiais de cães e gatos: lobos da tasmânia e gatos marsupiais, os "quolls".
Joshua me explicou tudo isso enquanto Charles brincava com uma bolinha, meio desajeitado. Passado o susto inicial do meu encontro alienígena, tomei interesse pelo bicho e fui lá brincar. De vez em quando o bicho soltava uns sons agudos, de alta frequência, um "quiquiqui" que certamente seriam inaudíveis para os vizinhos - como eu podia atestar. Charles não era filho único - Joshua tinha ainda uma fêmea, mais tímida, porém muito carinhosa, chamada Sue.
Meu vizinho passou a tentar me empurrar um filhote de uma ninhada que planejava para dezembro, mas eu não estava animado com a idéia de ter um animal estranho dentro de casa...passou a listar as inúmeras qualidades dos marsupiais: temperamento dócil, hábitos alimentares modestos, resistência à maioria das doenças comuns de cães e gatos e ausência de cheiro forte (só na cabeça dele). Passado um certo tempo, percebi que Joshua saía para caminhar com os bichos bem cedinho, para não chamar muita atenção. Curioso, resolvi acompanhá-lo numa dessas manhãs frias de Sampa. Lá pelas tantas, Charles parou perto de um muro e fez suas necessidades...mais que depressa, Joshua enfiou sua mão debaixo da barriga de Sue e puxou um saquinho plástico, que usou para recolher as fezes: "Marsúpio. Não sei como donos de cães vivem sem isso." Me contou que uma das características desenvolvidas com os sucessivos cruzamentos foi um marsúpio muito maior que o normal - assim como poodles apresentam pelagem lanosa.
Acabei não aceitando o único filhote da ninhada de Charles e Sue, Joshua se mudou daqui há uns três meses, levando seus bichinhos consigo. Sinto um pouco de saudades dos "quiquiquis" que não ouvia, e só agora entendi porque Joshua vivia de pochete.
Charles no sofá do Joshua
domingo, 13 de março de 2011
Apoteose
Postado por
Marcílio, o gêmeo malvado
If your are dumb beyond help:
Idéia que eu o e Gabriel tivemos há alguns anos, de unir duas das coisas mais toscas e mais vendidas: os livros de auto-ajuda e os livros "for dummies" - bem menos toscos que os primeiros.
Em inglês, "for dummies", quer dizer algo como "bobos". Na tradução tosca e politicamente correta para o potuguês, ficou "para leigos".
A frase está em inglês por conta da expressão "beyond help", que quer dizer "além do que possa ser ajudado", ou "tá fudido".
Olha o que eu descobri: http://www.selfhelpmagazine.com/
sábado, 12 de março de 2011
piada inconveniente
Postado por
Marcílio, o gêmeo malvado
Única menção na segunda página da Folha de S. Paulo sobre a tragédia de ontem no Japão:
É do João Montanaro, chargista de 15 anos que ocupa, desde o ano passado, a charge da página 2 nos dias de sábado.
Não quero julgar o garoto, mas é o tipo de piada que certamente pega mal...assim que abri a Folha de hoje fiquei imaginando que amanhã (domingo), haverão muitas cartas de leitores revoltados. A segunda página é o espaço do editorial da Folha, no qual eles emitem opiniões. Já que o jornal se absteve de falar qualquer coisa em editorial, mesmo porque é difícil emitir opiniões acerca de eventos naturais fora de nosso controle, seria prudente não ter charge sobre o assunto...se quisessem, poderiam comparar com o terremoto do Haiti, que matou 200 mil, ou mesmo com o tsunâmi do Índico de 2004, que atingiu o sudeste asiático deixando 295 mil mortos, ressaltando a diferença que a infra-estrutura faz;
Por um lado, é louvável que a Folha não interfira no trabalho de seus colaboradores, assim, o Angeli publica o que bem entende...mas nesse caso, talvez fosse prudente um telefonema perguntando "você tem certeza que quer publicar essa charge?
A responsabilidade é do jornal. E não é a primeira vez que isso ocorre. Em agosto de 2009, o caderno de turismo da Folha trazia uma manchete de gosto duvidoso: "Balança, mas não cai", uma piadinha que fazia referência ao balançar dos navios de cruzeiro e com o acidente da TAM em Congonhas.
Tudo bem pro João, que vem mandando muito bem, mas tem apenas 15 anos. Falta dos "adultos responsáveis" da Folha.
É do João Montanaro, chargista de 15 anos que ocupa, desde o ano passado, a charge da página 2 nos dias de sábado.
Não quero julgar o garoto, mas é o tipo de piada que certamente pega mal...assim que abri a Folha de hoje fiquei imaginando que amanhã (domingo), haverão muitas cartas de leitores revoltados. A segunda página é o espaço do editorial da Folha, no qual eles emitem opiniões. Já que o jornal se absteve de falar qualquer coisa em editorial, mesmo porque é difícil emitir opiniões acerca de eventos naturais fora de nosso controle, seria prudente não ter charge sobre o assunto...se quisessem, poderiam comparar com o terremoto do Haiti, que matou 200 mil, ou mesmo com o tsunâmi do Índico de 2004, que atingiu o sudeste asiático deixando 295 mil mortos, ressaltando a diferença que a infra-estrutura faz;
Por um lado, é louvável que a Folha não interfira no trabalho de seus colaboradores, assim, o Angeli publica o que bem entende...mas nesse caso, talvez fosse prudente um telefonema perguntando "você tem certeza que quer publicar essa charge?
A responsabilidade é do jornal. E não é a primeira vez que isso ocorre. Em agosto de 2009, o caderno de turismo da Folha trazia uma manchete de gosto duvidoso: "Balança, mas não cai", uma piadinha que fazia referência ao balançar dos navios de cruzeiro e com o acidente da TAM em Congonhas.
Tudo bem pro João, que vem mandando muito bem, mas tem apenas 15 anos. Falta dos "adultos responsáveis" da Folha.
Quer ser macho de verdade? Pergunte-me como.
Postado por
Marcílio, o gêmeo malvado
Já foi abordado por um vendedor de Herbalife, Amway ou qualquer outra empresa desse gênero? Ou nem sabe que gênero é esse? Se nunca te abordaram, você certamente já viu adesivos em carros que dizem "Quer emagrecer? Pergunte-me como", ou "Seja seu próprio chefe".
Se você sabe bem como isso funciona, pode pular toda a parte em vermelho, na qual montei um pequeno exemplo do esquema, porque o que interessa está depois disso e é muito engraçado.
Rápida explicação: uma pessoa te apresenta um negócio maravilhoso, no qual você pode trabalhar o tempo que você quiser, ser seu próprio chefe, ganhar uma porrilhão de dólares e ainda por cima perder peso. Atraente, não?
Pois tudo que você tem a fazer é comprar um kit para ingressar na empresa e se tornar, digamos, um associado. Tudo que você comprar te dará algum retorno: se você compra R$1.000,00 em produtos, eles te mandam uma pequena porcentagem disso, digamos, 1%, ou R$10,00. Como fazer então para ganhar dinheiro? Simples: você recruta mais 5 pessoas, e cada uma delas compra seus R$1.000,00. Você recebe de volta seus R$10,00 e mais R$10,00 de cada pessoa abaixo de você...já são R$60,00. Ainda não é o suficiente, então, essas 5 pessoas devem arranjar mais 5, e com isso a sua rede passa a ter 156 pessoas, e você finalmente recebe R$1.560,00. Lembrando que você gastou R$1.000,00 em produtos, lucrou R$560,00. Hum...não parece o suficiente para largar seu emprego, ser seu próprio chefe e trabalhar só o tempo que quiser...mas se as 125 pessoas que estão 3 níveis abaixo de você conseguirem mais 5 cada, já são 781 pessoas na rede, e você tira por mês, descontando os seus R$1.000,00, R$6.810,00/mês. Se conseguir mais um nível embaixo de todos, chegará a R$38.060,00...e por aí vai.
Mas calma, não comprem ainda...existem alguns probleminhas nessa fábrica de dinheiro:
1) você não é o único distribuidor do mundo, do país e nem de sua cidade.
2) Os produtos são caros, e na maioria das vezes, não trazem os benefícios prometidos - o famoso shake da Herbalife, por exemplo, foi submetido a um teste de PROTESTE, uma associação de defesa dos direitos do consumidor. Não só se pior que aqueles comuns, vendidos em qualquer supermercado, como podem fazer mal à saúde. E custam muito mais.
3) É muito difícil conseguir 5 pessoas dispostas a gastar R$1.000,00 mensalmente por muito tempo. Fazer com que cada uma das 5 consiga mais 5, e essas 25 mais 5, e essas 25 mais 125, e essas 125 mais 625, e essas 625 mais 3.125...............
Enfim, é o que se chama de "Marketing Multinível", ou MMN, nome inventado para burlar a legislação norte-americana, onde "pirâmide financeira" é crime. Mas enfim, é exatamente isso que essas empresas são. As reuniões são verdadeiras sessões de lavagem cerebral, onde aqueles que ficaram ricos nesse esquema (pouquíssimos) dão seus depoimentos, incentivando o pessoal lá na base da pirâmide, dizendo que eles podem chegar lá. Já fui em algumas dessas porque pessoas próximas de mim já fizeram parte disso (Amway e Herbalife). Vi professores falando que tem que ser muito estúpido pra querer ficar numa universidade pública ao invés de perseguir seus sonhos, que ele tinha saído e tava dando muito certo, blábláblá...imagino como esse cara está hoje em dia.
As pessoas engolem isso porque ficam tão inebriadas com a possibilidade do dinheiro fácil que não param pra pensar. Mas dá pra ver o exemplo que dei acima de duas formas:
"Olha, se você colocar 5 pessoas abaixo de você, e cada uma dessas mais 5, e assim por diante, quando você chegar a ter 5 níveis abaixo de você, vai ganhar uns R$40 mil todo mês!"
ou:
"Numa pirâmide com 3.906 pessoas, uma vai ganhar quase 40 mil, portanto 0,03% de todo mundo que entrou no negócio, isso se todo mundo conseguisse seus 5 distribuidores. 5 pessoas nessa rede ganharão quase R$7 mil, ou 0,13% das pessoas na rede. 0,64% das pessoas ainda terão o pequeno lucro de R$560,00, e a esmagadora maioria, de 99,20% terão prejuízo, sendo que 80% perderão R$990,00 todo mês. e outros 16% perderão R$940,00/mês. Claro que esses 96% não ficarão muito tempo no negócio...enfim, é um mdelo que funciona pra pouquíssima gente.
Há uns dois anos fui na apresentação de uma amiga de minha irmã, que à época estava muito empolgada com uma empresa chama Agel, especializada em...........GEL!!!
Tinha gel de comer, de beber, de passar no machucado do menino, de arrumar cabelo,, de limpar tela de TV, de polir o carro, de impedir gravidez indesejada e até de emagrecer (sempre tem algo de emagrecer).
Depois de assistir toda a apresentação, minha irmã e cunhado - que eram quem de fato haviam sido convidados - gentilmente recusaram aquilo que parecia ser irrecusável, e ouviram o seguinte do marido dessa amiga: "Pensem bem. Vocês não estão dizendo não para mim. Estão dizendo não para o futuro de sua filhinha." É dose, né?
"Man Cave" quer dizer "Caverna do Homem", e é um termo que se usa nos países de língua inglesa para se referir ao "cantinho do homem" ou "Clube do Bolinha", tradicionalmente aqueles porões de casas americanas com mesa de bilhar, TV de tela grande, mesa de carteado e outros apetrechos, onde os machos se reúnem para assistir esportes e beber. Nada contra, na verdade são espaços de entretenimento super-mega-hiper-legais, e como eu gosto de futebol, cerveja e poltronas confortáveis, não acharia ruim ter um espaço assim.
Pois bem. Há uma empresa de MMN (a tal pirâmide financeira) onde os distribuidores vendem acessórios para espaços masculinos, equipamentos para churrasco e carnes. Eu descobri a tal empresa em um programa chamado "Penn & Teller Bullshit". Não dei muita bola na época, mas ao responder um e-mail enviado pelo Marcel sobre a Herbalife, me lembrei daquilo e fui procurar o site de algum distribuidor da ManCave. Para ver, clique aqui.
O site é engraçadíssimo...logo da primeira página, que reproduzo aqui embaixo, vem o slogan: "Coisas que os homens querem":
Ao escolher "Man food" - comida de macho - a gente se depara com 83 opções!!! Dentre elas, 45 opções de linguiças e salsichas dos mais variados sabores, como essa aqui:
A descrição diz o seguinte: "Nossa linguiça best-seller no formato footlong (comprimento de 1 pé, uns 30cm)! Temperada com o verdadeiro molho Buffalo (aquele molho apimentado das asinhas de frango) e bleu cheese. Agradará com certeza! 6 linguiças de 1 pé numa embalagem de 3 libras selada a vácuo."
Agora, é na seção "Home bar" que encontrei as coisas mais interessantes:
Diz o anúncio que basta apertar o botão para que seu porta-latas comece a emitir sons e luzes. Funciona a até 20 metros de distância.
Caramba...eu acho que nunca perdi uma latinha tão longe. E também não quero minha cerveja dando escândalo, especialmente com sons e luzes. Isso é coisa de macho?
Para ser usada na mão esquerda. Ajusta-se a qualquer lata (oooohhh!!! como conseguiram???) e mantém a cerveja gelada e sua mão quentinha.
Meu...isso é coisa de macho mesmo??? Que infeliz não dá conta de segurar uma latinha porque a cerveja tá muito gelada?? Ah, vá...e quem vai andar numa festa com uma merda dessas na mão?
Essa senhora:
Por fim, as velas aromáticas. Essa aqui, por exemplo, tem cheiro de peido:
Na descrição diz assim: "smells like real butt" - "fede como uma bunda de verdade".
Isso é vela pra quem quer aquele cheiro de peido mas acha muito nojento ficar peidando socialmente...e tem ainda nos aromas bacon, carne de panela, cerveja e churrasco.
Macho que é macho peida na frente dos outros e dá risada. Já uma velinha simuladora de peidos...
Moral da história: quem compra ManCave está, desesperadamente, tentando provar algo.
Aqui embaixo, as duas partes do programa de Penn & Teller sobre esse esquema, através do qual descobri a ManCave. Não achei legendado, mas pra quem entende vale a pena:
sexta-feira, 11 de março de 2011
Não assistam. É sério.
Postado por
Marcílio, o gêmeo malvado
Cartaz no Espaço Unibanco:
O título em português: "Tio Boonmee, que pode recordar suas vidas passadas".
E as críticas:
- "Um dos melhores filmes de 2010! Misterioso, sonhador, delicado e mágico."
(Peter Bradshaw - The Guardian)
- "Belo e perturbador realismo contemplativo e uma linguagem altamente poética."
(Alcino Leite Neto - Folha de S. Paulo)
- "De um lirismo mágico, é o cinema dos sonhos."
(Rodrigo Fonseca - O Globo)
Bom. Das críticas acima, só me serve um trechinho: perturbador. Honestamente, eu não saberia explicar sobre o que é esse filme. No meio da história eu achei que fosse acontecer alguma coisa, mas não aconteceu.
Começa com um boi fugindo, uns macacos de olhos vermelhos (que é o filho perdido do tio Boonmee, que está morrendo de alguma coisa no fígado), e termina com um monge saindo do corpo. No meio de tudo isso, tem uma cena de um bagre fazendo sexo com uma princesa.
Bem...pouco antes do final eu estava pensando se devia assistir de novo, talvez seja algo genial, mas resolvi que seria melhor não fazer isso. O filme não é genial, não lembra "Sonhos" do Kurosawa e esses críticos de cinema estão atingindo o ápice da pretensão humana.
E as críticas:
- "Um dos melhores filmes de 2010! Misterioso, sonhador, delicado e mágico."
(Peter Bradshaw - The Guardian)
- "Belo e perturbador realismo contemplativo e uma linguagem altamente poética."
(Alcino Leite Neto - Folha de S. Paulo)
- "De um lirismo mágico, é o cinema dos sonhos."
(Rodrigo Fonseca - O Globo)
Bom. Das críticas acima, só me serve um trechinho: perturbador. Honestamente, eu não saberia explicar sobre o que é esse filme. No meio da história eu achei que fosse acontecer alguma coisa, mas não aconteceu.
Começa com um boi fugindo, uns macacos de olhos vermelhos (que é o filho perdido do tio Boonmee, que está morrendo de alguma coisa no fígado), e termina com um monge saindo do corpo. No meio de tudo isso, tem uma cena de um bagre fazendo sexo com uma princesa.
Bem...pouco antes do final eu estava pensando se devia assistir de novo, talvez seja algo genial, mas resolvi que seria melhor não fazer isso. O filme não é genial, não lembra "Sonhos" do Kurosawa e esses críticos de cinema estão atingindo o ápice da pretensão humana.
quinta-feira, 10 de março de 2011
Moacyr Scliar
Postado por
Marcílio, o gêmeo malvado
Pra quem não sabe, morreu, no último 27 de fevereiro, o médico, escritor e cronista gaúcho Moacyr Scliar. Pra ser honesto, eu não fazia a menor idéia de uma porção de coisas, como, por exemplo, o fato de que ele fazia parte da ABL. Só o conhecia pelas crônicas semanais na Folha, que ele costumava fazer baseado nas notícias mais esdrúxulas publicadas pelo jornal. De forma geral, suas crônicas eram sutis, quase ingênuas, daquele tipo de humor que deixa os leitores com um sorrisinho, não às gargalhadas. Eu estava esperando uma reportagem que fizesse justiça para elaborar um textinho (pretensiosamente) parecido. Aqui vai:
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Espinhos
Graças à perda de um fragmento de material genético, o homem escapou de ter espinhos no pênis feitos do mesmo material das unhas, a queratina, como têm os chimpanzés e outros mamíferos, como os gatos.
Os espinhos queratinizados aumentam a sensibilidade táctil do pênis e tornam o coito mais rápido, embora possam machucar a fêmea. Para sorte das mulheres, o pênis do homem é liso. Esse tipo de pênis sem "acessórios" costuma estar vinculado a espécies monogâmicas e tende a prolongar a relação sexual, criando um maior vínculo entre os parceiros.
Os espinhos queratinizados aumentam a sensibilidade táctil do pênis e tornam o coito mais rápido, embora possam machucar a fêmea. Para sorte das mulheres, o pênis do homem é liso. Esse tipo de pênis sem "acessórios" costuma estar vinculado a espécies monogâmicas e tende a prolongar a relação sexual, criando um maior vínculo entre os parceiros.
Ciência, 10 de março de 2011
Ludovico e Fátima eram casados há 41 anos. Ela naquela fase de aproveitar a "melhor idade", participava de cursos de informática, ioga, tricotava e uma vez por ano viajava com um grupo de senhoras para conhecer igrejas antigas. Ano passado havia estreado a câmera digital que ganhara de seu neto, Ludoviquinho, ou Jonas, como gostava de ser chamado. Acabou lançando um blog com suas fotos, muito feio mas cheio de comentários dos filhos, netos e sobrinhos. Ludovico, por outro lado, passava os dias em casa, gritando com a TV quando o noticiário o desagradava e eventualmente fazendo pequenos reparos na casa, que de tão velha e cheia de objetos religiosos, acreditava que podia fazer parte do roteiro das viagens da esposa. E mais: era tão, mas tão antiquado que tinha espinhos no pênis, fato que incomodava Fátima.
Fátima frequentava os bailes da saudade sozinha, visto que Ludovico não era dado a esse tipo de coisa e nem deixava (lógico!), que a esposa dançasse com outros homens, de forma que ela apenas participava da organização, sempre usando saias longas, pois mulher que se preze não usa calças.
A insatisfação crescente de Fátima acabou em um divórcio. Em pouco tempo conheceu Haroldo, homem gentil, pouco mais novo que gostava muito de viajar e dançar. Está muito feliz com o novo romance, e é apoiada por todos os filhos. Mais ainda, com a descoberta de que Haroldo e a maioria dos homens dos dias de hoje não possuem os incômodos espinhos no pênis.
Ludovico continua só, não arrumou namorada e está pensando em consultar um médico para resolver seu problema.
Marcelo Nakashima
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P.S. Pra deixar claro, estou patenteando os direitos da expressão "espinhos no pinto. Seguem algumas sugestões de uso. Valem também as expressões "espinhos no caralho", "espinhos no pau" e "espinhos na pica".
Mulher conversando com amiga: Acredita que ele disse que me proibia de ir à praia vestindo aquele biquini?
Amiga: Deve ter espinhos no pau.
Pai: Vestida desse jeito você não sai daqui nem morta!
Filha: Ah pai, que saco...parece que tem espinho no pinto...
Mulher traída: Vai enfiar esse pinto cheio de espinhos na puta que te pariu!
Mulher minha não sai de casa sem lavar a louça antes. Homem que é homem tem espinho no pau.
Por fim, reproduzo a última coluna de Moacy Scliar:
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Lágrimas e testosterona
Atenção, mulheres, está demonstrado pela ciência: chorar é golpe baixo. As lágrimas femininas liberam substâncias, descobriram os cientistas, que abaixam na hora o nível de testosterona do homem que estiver por perto, deixando o sujeito menos agressivo.
Os cientistas queriam ter certeza de que isso acontece em função de alguma molécula liberada -e não, digamos, pela cara de sofrimento feminina, com sua reputação de derrubar até o mais insensível dos durões. Por isso, evitaram que os homens pudessem ver as mulheres chorando. Os cientistas molharam pequenos pedaços de papel em lágrimas de mulher e deixaram que fossem cheirados pelos homens.
O contato com as lágrimas fez a concentração da testosterona deles cair quase 15%, em certo sentido deixando-os menos machões.
Ciência, 7 de janeiro de 2011
ELE VIVIA FURIOSO com a mulher. Por, achava ele, boas razões. Ela era relaxada com a casa, deixava faltar comida na geladeira, não cuidava bem das crianças, gastava demais. Cada vez, porém, que queria repreendê-la por uma dessas coisas, ela começava a chorar. E aí, pronto: ele simplesmente perdia o ânimo, derretia. Acabava desistindo da briga, o que o deixava furioso: afinal, se ele não chamasse a mulher à razão, quem o faria? Mais que isso, não entendia o seu próprio comportamento. Considerava-se um cara durão, detestava gente chorona.
Por que o pranto da mulher o comovia tanto? E comovia-o à distância, inclusive. Muitas vezes ela se trancava no quarto para chorar sozinha, longe dele. E mesmo assim ele se comovia de uma maneira absurda.
Foi então que leu sobre a relação entre lágrimas de mulher e a testosterona, o hormônio masculino. Foi uma verdadeira revelação. Finalmente tinha uma explicação lógica, científica, sobre o que estava acontecendo. As lágrimas diminuíam a testosterona em seu organismo, privando-o da natural agressividade do sexo masculino, transformando-o num cordeirinho.
Uma ideia lhe ocorreu: e se tomasse injeções de testosterona? Era o que o seu irmão mais velho fazia, mas por carência do hormônio.
Com ele conseguiu duas ampolas do hormônio. Seu plano era muito simples: fazer a injeção, esperar alguns dias para que o nível da substância aumentasse em seu organismo e então chamar a esposa à razão.
Decidido, foi à farmácia e pediu ao encarregado que lhe aplicasse a testosterona, mentindo que depois traria a receita. Enquanto isso era feito, ele, de repente, caiu no choro, um choro tão convulso que o homem se assustou: alguma coisa estava acontecendo?
É que eu tenho medo de injeção, ele disse, entre soluços. Pediu desculpas e saiu precipitadamente. Estava voltando para casa. Para a esposa e suas lágrimas.
Moacyr Scliar
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ainda anteontem: Gabby Schulz
Postado por
Gabriel G;
...esqueci desta aqui. Gabby Schulz é um quadrinhista americano que volta e meia discute o sexismo. Este abaixo foi o primeiro quadrinho que vi dele. Tem muito a ver com o testo da Marjorie do post anterior, e ainda por cima é um quadrinho bem engraçado.
Abaixo vai uma amostra.
Abaixo vai uma amostra.
Pra ler a HQ inteira, vá pra este post do autor: In which we betray our Gender.
terça-feira, 8 de março de 2011
oito de março.
Postado por
Gabriel G;
Talvez se esse dia se chamasse "dia da consciência feminina" as pessoas parassem de confundi-lo com um dia de comemoração. Mas seria um nome mais feio.
Já falei sobre o assunto antes, mas cheguei à conclusão que talvez o melhor que eu poderia fazer é falar sobre o homem. Mas, pra isso, chamo o Laerte:
Sobre a mulher, não tenho nada melhor a oferecer que um texto do ano retrasado, de outra pessoa. Não tenho nada melhor mesmo: até este momento, é o meu texto preferido sobre este dia, feito por alguém que sabe mais do assunto e escreve bem melhor do que eu. (o conjunto de liks vale a pena também)
Dispenso essa rosa
Marjorie Rodrigues
Dia 8 de março seria um dia como qualquer outro, não fosse pela rosa e os parabéns. Toda mulher sabe como é. Ao chegar ao trabalho e dar bom dia aos colegas, algum deles vai soltar: “parabéns”.
Por alguns segundos, a gente tenta entender por que raios estamos recebendo parabéns se não é nosso aniversário (exceção, claro, à minoria que, de fato, faz aniversário neste dia). Depois de ficar com cara de bestas, num estalo a gente se lembra da data, dá um sorriso amarelo e responde “obrigada”, pensando: “mas por que eu deveria receber parabéns por ser mulher?”.
Mais tarde, chega um funcionário distribuindo rosas. Novamente, sorriso amarelo e obrigada. É assim todos os anos. Quando não é no trabalho, é em alguma loja. Quando não é numa loja, é no supermercado. Todos os anos, todo 8 de março: é sempre a maldita rosa.
Dizem que a rosa simboliza a “feminilidade”, a delicadeza. É a mesma metáfora que usam para coibir nossa sexualidade – da supervalorização da virgindidade é que saiu o verbo “deflorar” (como se o homem, ao romper o hímen de uma mulher, arrancasse a flor do solo, tomando-a para si e condenando-a – afinal, depois de arrancada da terra, a flor está fadada à morte). É da metáfora da flor, portanto, que vem a idéia de que mulheres sexualmente ativas são “putas”, inferiores, menos respeitáveis.
A delicadeza da flor também é sua fraqueza. Qualquer movimento mais brusco lhe arranca as pétalas. Dizem o mesmo de nós: que somos o “sexo frágil” e que, por isso, devemos ser protegidas. Mas protegidas do quê? De quem? A julgar pelo número de estupros, precisamos de proteção contra os homens. Ah, mas os homens que estupram são psicopatas, dizem. São loucos. Não é com estes homens que nós namoramos e casamos, não é a eles que confiamos a tarefa de nos proteger. Mas, bem, segundo pesquisa Ibope/Instituto Patricia Galvão, 51% dos brasileiros dizem conhecer alguma mulher que é agredida por seu parceiro. No resto do mundo, em 40 a 70 por cento dos assassinatos de mulheres, o autor é o próprio marido ou companheiro. Este tipo de crime também aparece com frequência na mídia. No entanto, são tratados como crimes “passionais” – o que dá a errônea impressão de que homens e mulheres os cometem com a mesma frequência, já que a paixão é algo que acomete ambos os sexos. Tratam os homens autores destes crimes como “românticos” exagerados, príncipes encantados que foram longe demais. No entanto, são as mulheres as neuróticas nos filmes e novelas. São elas que “amam demais”, não os homens.
Mas a rosa também tem espinhos, o que a torna ainda mais simbólica dos mitos que o patriarcado atribuiu às mulheres. Somos ardilosas, traiçoeiras, manipuladoras, castradoras. Nós é que fomos nos meter com a serpente e tiramos o pobre Adão do paraíso (como se Eva lhe tivesse enfiado a maçã goela abaixo, como se ele não a tivesse comido de livre e espontânea vontade). Várias culturas têm a lenda da vagina dentata. Em Hollywood, as mulheres usam a “sedução” para prejudicar os homens e conseguir o que querem. Nos intervalos do canal Sony, os machos são de “respeito” e as mulheres têm “mentes perigosas”. A mensagem subliminar é: “cuidado, meninos, as mulheres são o capeta disfarçado”. E, foi com medo do capeta que a sociedade, ao longo dos séculos, prendeu as mulheres dentro de casa. Como se isso não fosse suficiente, limitaram seus movimentos com espartilhos, sapatos minúsculos (na China), saltos altos. Impediram-na que estudasse, que trabalhasse, que tivesse vida própria. Ela era uma propriedade do pai, depois do marido. Tinha sempre de estar sob a tutela de alguém, senão sua “mente perigosa” causaria coisas terríveis.
Mas dizem que a rosa serve para mostrar que, hoje, nos valorizam. Hoje, sim. Vivemos num mundo “pós-feminista” afinal. Todas essas discriminações acabaram! As mulheres votam e trabalham! Não há mais nada para conquistar! Será mesmo? Nos últimos anos, as diferenças salariais entre homens e mulheres (que seguem as mesmas profissões) têm crescido no Brasil, em vez de diminuir. Nos centros urbanos, onde a estrutura ocupacional é mais complexa, a disparidade tende a ser pior. Considerando que recebo menos para desempenhar o mesmo serviço, não parece irônico que o meu colega de trabalho me dê os parabéns por ser mulher?
Dizem que a rosa é um sinal de reconhecimento das nossas capacidades. Mas, no ranking de igualdade política do Fórum Econômico Mundial de 2008, o Brasil está em 10oº lugar entre 130 países. As mulheres têm 11% dos cargos ministeriais e 9% dos assentos no Congresso – onde, das 513 cadeiras, apenas 46 são ocupadas por elas. Do total de prefeitos eleitos no ano passado,apenas 9,08% são mulheres. E nós somos 52% da população.
…Enquanto isso não acontecer, meu querido, enfia esta rosa no dignissímo senhor seu cu.
.(Texto tirado daqui.)
Já falei sobre o assunto antes, mas cheguei à conclusão que talvez o melhor que eu poderia fazer é falar sobre o homem. Mas, pra isso, chamo o Laerte:
Sobre a mulher, não tenho nada melhor a oferecer que um texto do ano retrasado, de outra pessoa. Não tenho nada melhor mesmo: até este momento, é o meu texto preferido sobre este dia, feito por alguém que sabe mais do assunto e escreve bem melhor do que eu. (o conjunto de liks vale a pena também)
Dispenso essa rosa
Marjorie Rodrigues
Dia 8 de março seria um dia como qualquer outro, não fosse pela rosa e os parabéns. Toda mulher sabe como é. Ao chegar ao trabalho e dar bom dia aos colegas, algum deles vai soltar: “parabéns”.
Por alguns segundos, a gente tenta entender por que raios estamos recebendo parabéns se não é nosso aniversário (exceção, claro, à minoria que, de fato, faz aniversário neste dia). Depois de ficar com cara de bestas, num estalo a gente se lembra da data, dá um sorriso amarelo e responde “obrigada”, pensando: “mas por que eu deveria receber parabéns por ser mulher?”.
Mais tarde, chega um funcionário distribuindo rosas. Novamente, sorriso amarelo e obrigada. É assim todos os anos. Quando não é no trabalho, é em alguma loja. Quando não é numa loja, é no supermercado. Todos os anos, todo 8 de março: é sempre a maldita rosa.
Dizem que a rosa simboliza a “feminilidade”, a delicadeza. É a mesma metáfora que usam para coibir nossa sexualidade – da supervalorização da virgindidade é que saiu o verbo “deflorar” (como se o homem, ao romper o hímen de uma mulher, arrancasse a flor do solo, tomando-a para si e condenando-a – afinal, depois de arrancada da terra, a flor está fadada à morte). É da metáfora da flor, portanto, que vem a idéia de que mulheres sexualmente ativas são “putas”, inferiores, menos respeitáveis.
A delicadeza da flor também é sua fraqueza. Qualquer movimento mais brusco lhe arranca as pétalas. Dizem o mesmo de nós: que somos o “sexo frágil” e que, por isso, devemos ser protegidas. Mas protegidas do quê? De quem? A julgar pelo número de estupros, precisamos de proteção contra os homens. Ah, mas os homens que estupram são psicopatas, dizem. São loucos. Não é com estes homens que nós namoramos e casamos, não é a eles que confiamos a tarefa de nos proteger. Mas, bem, segundo pesquisa Ibope/Instituto Patricia Galvão, 51% dos brasileiros dizem conhecer alguma mulher que é agredida por seu parceiro. No resto do mundo, em 40 a 70 por cento dos assassinatos de mulheres, o autor é o próprio marido ou companheiro. Este tipo de crime também aparece com frequência na mídia. No entanto, são tratados como crimes “passionais” – o que dá a errônea impressão de que homens e mulheres os cometem com a mesma frequência, já que a paixão é algo que acomete ambos os sexos. Tratam os homens autores destes crimes como “românticos” exagerados, príncipes encantados que foram longe demais. No entanto, são as mulheres as neuróticas nos filmes e novelas. São elas que “amam demais”, não os homens.
Mas a rosa também tem espinhos, o que a torna ainda mais simbólica dos mitos que o patriarcado atribuiu às mulheres. Somos ardilosas, traiçoeiras, manipuladoras, castradoras. Nós é que fomos nos meter com a serpente e tiramos o pobre Adão do paraíso (como se Eva lhe tivesse enfiado a maçã goela abaixo, como se ele não a tivesse comido de livre e espontânea vontade). Várias culturas têm a lenda da vagina dentata. Em Hollywood, as mulheres usam a “sedução” para prejudicar os homens e conseguir o que querem. Nos intervalos do canal Sony, os machos são de “respeito” e as mulheres têm “mentes perigosas”. A mensagem subliminar é: “cuidado, meninos, as mulheres são o capeta disfarçado”. E, foi com medo do capeta que a sociedade, ao longo dos séculos, prendeu as mulheres dentro de casa. Como se isso não fosse suficiente, limitaram seus movimentos com espartilhos, sapatos minúsculos (na China), saltos altos. Impediram-na que estudasse, que trabalhasse, que tivesse vida própria. Ela era uma propriedade do pai, depois do marido. Tinha sempre de estar sob a tutela de alguém, senão sua “mente perigosa” causaria coisas terríveis.
Mas dizem que a rosa serve para mostrar que, hoje, nos valorizam. Hoje, sim. Vivemos num mundo “pós-feminista” afinal. Todas essas discriminações acabaram! As mulheres votam e trabalham! Não há mais nada para conquistar! Será mesmo? Nos últimos anos, as diferenças salariais entre homens e mulheres (que seguem as mesmas profissões) têm crescido no Brasil, em vez de diminuir. Nos centros urbanos, onde a estrutura ocupacional é mais complexa, a disparidade tende a ser pior. Considerando que recebo menos para desempenhar o mesmo serviço, não parece irônico que o meu colega de trabalho me dê os parabéns por ser mulher?
Dizem que a rosa é um sinal de reconhecimento das nossas capacidades. Mas, no ranking de igualdade política do Fórum Econômico Mundial de 2008, o Brasil está em 10oº lugar entre 130 países. As mulheres têm 11% dos cargos ministeriais e 9% dos assentos no Congresso – onde, das 513 cadeiras, apenas 46 são ocupadas por elas. Do total de prefeitos eleitos no ano passado,apenas 9,08% são mulheres. E nós somos 52% da população.
A rosa também simboliza beleza. Ah, o sexo belo. Mas é só passar em frente a uma banca de revistas para descobrir que é exatamente o contrário. Você nunca está bonita o suficiente, bobinha. Não pode ser feliz enquanto não emagrecer. Não pode envelhecer. Não pode ter celulite (embora até bebês tenham furinhos na bunda). Você só terá valor quando for igual a uma modelo de 18 anos (as modelos têm 17 ou 18 anos até quando a propaganda é de creme rejuvenescedor…). Mas mesmo ela não é perfeita: tem de ser photoshopada. Sua pele é alterada a ponto de parecer de plástico: ela não tem espinhas nem estrias nem olheiras nem cicatrizes nem hematomas, nenhuma dessas coisas que a gente tem quando vive. Ela sorri, mas não tem linhas ao lado da boca. Faz cara de brava, mas sua testa não se franze. É magérrima (às vezes, anoréxica), mas não tem nenhum osso saltando. É a beleza impossível, mas você deve persegui-la mesmo assim, se quiser ser “feminina”. Porque, sim, feminilidade é isso: é “se cuidar”. Você não pode relaxar. Não pode se abandonar (em inglês, a expressão usada é exatamente esta: “let yourself go”). Usar uma porrada de cosméticos e fazer plásticas é a maneira (a única maneira, segundo os publicitários) de mostrar a si mesma e aos outros que você se ama. “Você se ama? Então corrija-se”. Por mais contraditória que pareça, é esta a mensagem.
Todo dia 8 de março, nos dão uma rosa como sinal de respeito. No entanto, a misoginia está em toda parte. Os anúncios e ensaios de moda glamurizam a violência contra a mulher. Nas propagandas de cerveja e programas humorísticos, as mulheres são bundas ambulantes, meros objetos sexuais. A pornografia mainstream (feita pela Hollywood pornô, uma indústira multibilionária) tem cada vez mais cenas de violência, estupro e simulação de atos sexuais feitos contra a vontade da mulher. Nos videogames, ganha pontos quem atropelar prostitutas.
Todo dia 8 de março, volto para casa e vejo um monte de mulheres com rosas vermelhas na mão, no metrô. É um sinal de cavalheirismo, dizem. Mas, no mesmo metrô, muitas mulheres são encoxadas todos os dias. Tanto que o Rio criou um vagão exclusivo para as mulheres, para que elas fujam de quem as assedia. Pois é, eles não punem os responsáveis. Acham difícil. Preferem isolar as vítimas. Enquanto não combatermos a idéia de que as mulheres que andam sozinhas por aí são “convidativas”, propriedade pública, isso nunca vai deixar de existir. Enquanto acharem que cantar uma mulher na rua é elogio , isso nunca vai deixar de existir. Atualmente, a propaganda da NET mostra um pinguim (?) dizendo “ê lá em casa” para uma enfermeira. Em outro comercial, o russo garoto-propaganda puxa três mulheres para perto de si, para que os telespectadores entendam que o “combo” da NET engloba três serviços. Aparentemente, temos de rir disso. Aparentemente, isso ajuda a vender TV por assinatura. Muito provavelmente, os publicitários criadores desta peça não sabem o que é andar pela rua sem ser interrompida por um completo desconhecido ameaçando “chupá-la todinha”.
Então, dá licença, mas eu dispenso esta rosa. Não preciso dela. Não a aceito. Não me sinto elogiada com ela. Não quero rosas. Eu quero igualdade de salários, mais representação política, mais respeito, menos violência e menos amarras. Eu quero, de fato, ser igual na sociedade. Eu quero, de fato, caminhar em direção a um mundo em que o feminismo não seja mais necessário.
Todo dia 8 de março, nos dão uma rosa como sinal de respeito. No entanto, a misoginia está em toda parte. Os anúncios e ensaios de moda glamurizam a violência contra a mulher. Nas propagandas de cerveja e programas humorísticos, as mulheres são bundas ambulantes, meros objetos sexuais. A pornografia mainstream (feita pela Hollywood pornô, uma indústira multibilionária) tem cada vez mais cenas de violência, estupro e simulação de atos sexuais feitos contra a vontade da mulher. Nos videogames, ganha pontos quem atropelar prostitutas.
Todo dia 8 de março, volto para casa e vejo um monte de mulheres com rosas vermelhas na mão, no metrô. É um sinal de cavalheirismo, dizem. Mas, no mesmo metrô, muitas mulheres são encoxadas todos os dias. Tanto que o Rio criou um vagão exclusivo para as mulheres, para que elas fujam de quem as assedia. Pois é, eles não punem os responsáveis. Acham difícil. Preferem isolar as vítimas. Enquanto não combatermos a idéia de que as mulheres que andam sozinhas por aí são “convidativas”, propriedade pública, isso nunca vai deixar de existir. Enquanto acharem que cantar uma mulher na rua é elogio , isso nunca vai deixar de existir. Atualmente, a propaganda da NET mostra um pinguim (?) dizendo “ê lá em casa” para uma enfermeira. Em outro comercial, o russo garoto-propaganda puxa três mulheres para perto de si, para que os telespectadores entendam que o “combo” da NET engloba três serviços. Aparentemente, temos de rir disso. Aparentemente, isso ajuda a vender TV por assinatura. Muito provavelmente, os publicitários criadores desta peça não sabem o que é andar pela rua sem ser interrompida por um completo desconhecido ameaçando “chupá-la todinha”.
Então, dá licença, mas eu dispenso esta rosa. Não preciso dela. Não a aceito. Não me sinto elogiada com ela. Não quero rosas. Eu quero igualdade de salários, mais representação política, mais respeito, menos violência e menos amarras. Eu quero, de fato, ser igual na sociedade. Eu quero, de fato, caminhar em direção a um mundo em que o feminismo não seja mais necessário.
.(Texto tirado daqui.)
quinta-feira, 3 de março de 2011
Isto é Esparta... de novo
Postado por
Gabriel G;
Pois: há três semanas, o "anjo do livro" (copyright by Mancha) me fez esbarrar com "Em defesa das causas perdidas", um catatau do Slavoj Zizek. E não é que, folheando-o, dei de cara com um texto chamado "a verdadeira esquerda de Hollywood"... que, entre vários filmes, discute justamente significados políticos de 300 com apontamentos bem diferentes dos meus.
Basicamente, entre outras provocações ele coloca que alguns filmes com mensagens superficialmente e obviamente vistas como "de esquerda" -- como Red, de Warren Beaty e mesmo uns de James Cameron como "Titanic" -- seriam um embuste para aquilo que um esquerdista tem de ter em vista nos dias de hoje, enquanto um filme como "300", acusado de facismo, guardaria vários valores genuinamente essenciais à "racionalidade revolucionária".
Pra minha sorte, tem o trecho exato de 300 na web, em inglês. Um pedacinho aqui:
The Spartan ruthless military discipline is not simply the external opposite of the Athenian "liberal democracy," it is its inherent condition, it lays the foundation for it: the free subject of Reason can only emerge through a ruthless self-discipline. True freedom is not a freedom of choice made from a safe distance, like choosing between a strawberry cake or a chocolate cake; true freedom overlaps with necessity, one makes a truly free choice when one's choice puts at stake one's very existence - one does it because one simply "cannot do it otherwise."
Vale a pena ir lá e ler tudo.
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