quinta-feira, 26 de novembro de 2015

Pater imperator mundi

( reflexões esparsas e pouco embasadas em cinco partes )


I.
Posto que uma gigantesca parte das pessoas do mundo é, em diferentes graus, basicamente estúpida e/ou brutal, o machismo é um estado de coisas em que:

a) homens tendem a ser tratados com mais permissividade diante de suas atitudes estúpidas e brutais, ou são mesmo ativamente incitados a serem brutais.

b) Mulheres são também ativa ou tacitamente incitadas a serem  estúpidas e brutais, de forma ligeiramente diferente. São incentivadas a serem estúpidas ao lidar com os homens -- pois mostrar demasiada inteligência ou independência é perigoso, tona-as "menos atraentes" ou "desagradáveis"; são incentivadas a serem brutais no tratamento de outras mulheres, que devem ser vistas fundamentalmente como rivais/inimigas interesseiras numa eternizada e essencializada procura por homens.

O patriarcado tem feito sucesso porque, entre outras coisas, justamente apóia-se na reafirmação da ruindade mediana do ser humano -- como já disse, a estupidez e brutalidade da maioria das pessoas.

II.
Até antes mesmo de ser um estado de homem > mulher, o "patriarcado" é, essencialmente, um estado em que "mais forte/agressivo = melhor". O tal "patriarcado", assim compreendido, impõe um estado de naturalização e essencialização da agressividade e da força como "ordem natural" tácita do universo. Nessa ordem, homens também são o tempo todo brutalizados, em especial na infância; brutalizados como incentivo a serem brutais; e, particularmente, brutalizados se não o conseguirem sê-lo.

III.
No Estado civilizado, a "força" inicialmente física e pessoal é transposta, sublimada e transfigurada para o comportamento e para a centralidade da norma como "grande dominância". Estar na norma = estar alinhado/submisso ao forte. Ou você é forte por si, ou você é ativamente submisso e se adapta em reafirmar a força do forte. Se for visivelmente fraco, ou visivelmente não-alinhado, vai sofrer.

IV. A regra, a moral patricarcal implícita: saiu da norma = tem que se foder.
E não estou falando aqui de crime ou algo que faça mal aos outros, falo simplesmente do fato de alguém não se enquadrar nas regras expressas ou tácitas de como se deve ser. Ou seja: você pode até não fazer realmente mal a ninguém, mas ainda assim será agredido só por não ser forte ou igual o suficiente.
Não fazer parte do coro do poder fará com que aqueles dentro do coro -- especialmente aqueles  mais fracos, mais ávidos e/ou mais inseguros de sua posição -- visem você como alvo/vítima para, pelo exercício do poder (violência) se reafirmarem como parte do coro.
É por isso que o que os americanos chamam de "bullying" é tão comum -- e é por isso que geralmente envolve torcidinhas ou platéias de gente assistindo e se regozijando com a humilhação e o desconforto de outro.
Todos reafirmam a segurança de sua posição na maldita hierarquia tácita pisando naqueles que estão abaixo ou fora dela.

V. Nem só de obediência vive o patriarcado, muito pelo contrário: "Romper as regras" é a suprema demonstração de "força". Seja o engravatado e audaciosos negociante inovador que "muda o jogo" e dirige seu carrão, seja o marginal com arma na mão e correntes de ouro: todos são signos de um PINTO GRANDE, o falo que rompe e irrompe. Mas, é claro, trata-se de um rompimento fingido, encenado -- um rompimento que se dá basicamente dentro das mesmas categorias de agressividade e afirmação pela agressividade.


quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Admirável fascio novo

Quem considera que "fascismo" seja apenas a união sob um líder carismático e um estado enorme e visivelmente tirânico não entendeu nada, não entende nada e provavelmente continuará sem entender nada.

O novo fascismo tentará sempre matar amanhã o velhote inimigo que morreu ontem, ou que nem mesmo existiu); e nesse esforço continuamente acobertará os muitos que padecem e morrem hoje.

O novo facismo não será multidões em marcha em parada pública, com suas botas em uníssono, seu sizo e um grande führer.

Não será fascismo Orwell-84, fascismo-Stalin de ascetismo e frugalidade; mum pouco mais facismo Huxley (admirável novo fascio), fascismo de proveta, automatizado, de abundância programada: tem-se o que quer que desejar, pois é o próprio desejo que tornou-se politicamente inofensivo.

o novo fascismo será espargido, infrasubjetivo, privado, capitalizado.

o novo fascismo será terceirizado.

o novo fascismo será proativo, do-it-yourself. Será opensource, produzido em rede. wikifascio.

o novo fascismo será conectado. Será LOL, WTF, mind-blowing. Será facismo "com uma face humana". Fascismo miguxo.

O novo fascismo será a estetização da política como sempre, mas não qualquer uma: será chinelagem kitsch-zueira, ou será de afetação gourmetizada, ou será simples fofura ostensiva. Fascismo boçal, facismo troll, fascismo huehuebrbrbr. Fascismo Romeiro Brito.

O novo fascismo será de ruas cheias de gente midiática: gente colorida, classe-média (alta), se divertindo e se sentindo cívica só de aparecer. Levando babá e empregada para o movimento. Fascismo-selfie.
Fascismo-micareta.

Será fascismo "libertarian" (neoliberal), fascismo-com-cara-de-liberdade.
Fascismo-Free lights: cada um na sua, mas com alguma coisa em comum.

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Dois pesos, duas medidas



Segunda-feira, 02/11/2015:


"Haddad tem sua pior avaliação"


Manchete em cinco colunas, gráficos no cabeçalho e uma chamada de duas colunas.

A avaliação negativa do prefeito chegou em 49%.  Apesar disso, as políticas públicas da prefeitura são aprovadas pela população, ou pelo menos divide as opiniões:

Fechamento da Av. Paulista para carros: 47% a favor x 43% contra

Redução da velocidade nas principais vias: 47% a favor x 47% contra

Implantação das Ciclovias: 56% a favor x 39% contra



Quarta-feira, 04/11/2015:

"Paulistano reprova gestão da crise da água por Alckmin"


Um quadradinho no canto inferior direito da página, uma coluna de largura, com direito a um gráfico acanhado.

48% dos paulistanos consideram a atuação do governador na gestão do0s efeitos da seca como ruim/péssima.

84% (!!!) consideram que o governo "só fornece dados que interessam a ele próprio".

35% dos paulistanos relataram ter ficado sem água em cinco ou mais dias no último mês (aqui no prédio foram 4 dias).

O racionamento, que segundo o governador não existe, atinge mais os mais pobres.  A tendência é curiosa e lindamente linear.  A porcentagem daqueles que citam a interrupção de água em 5 dias ou mais, dividida por estratos de renda fica assim:

até 2 salários mínimos: 42%
de 2 a 5 salários mínimos: 36%
de 5 a 10 salários mínimos: 26%
mais de 10 salários mínimos: 19%

Esse conjunto de dados não mereceu maior atenção do jornal dito imparcial.  Há alguma diferença de tratamento?

Vejamos:

O jornal tenta produzir uma relação entre a desaprovação de  minoria à avaliação negativa da gestão de Fernando Haddad, embora a avaliação dos efeitos de tais políticas seja positiva - políticas públicas de mobilidade urbana e uso do espaço público pelo público, mas especialmente a redução nos acidentes de trânsito relacionados à redução das velocidades máximas.

Ao mesmo tempo, a reprovação do desempenho de Alckmin (48%), essa relacionada ao fato de que mais de um terço da população ficou sem água pelo menos 5 dias no mês, sendo a maioria pobre mais atingida, é tratada no interior do jornal (cada vez mais fino), sem qualquer destaque na primeira página.

Depois o pessoal do SAC não entende por que eu não volto a assinar esse panfleto.



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