sábado, 15 de dezembro de 2012

Dia do arquiteto: a "evidência Niemeyer"

(Aconteceu há alguns meses; mas, por ocasião da recente morte de Oscar Niemeyer e de nosso novo "dia do arquiteto", acho que vale a pena relembrar...)

Numa  discussão coletiva sobre Evolução x "Intelligent Design" no meu facebook (totalmente involuntária de minha parte, ressalto), tive que presenciar um arquiteto (defensor do I.D.) dizer a outro a seguinte frase:
"Um arquiteto ateu é sempre um constrangimento extra: se não consegue ler o melhor Projeto de todos, estampado não apenas até onde o olho alcança, mas sendo o próprio olho uma parte integrante dele, como ele pode querer projetar algo que preste?"
Achei interessante destacar tal frase porque nela se vê uma amostra perfeita de como funciona a retórica mistificadora de certos polemistas que têm abundado cada vez mais na imprensa e, especialmente, na internet.Trata-se de uma frase de efeito bem colocada, que irrita e ofende seu interlocutor indiretamente (ou seja, sem xingá-lo de incompetente  de forma literal), e que é aparentemente coerente e lógica... Mas que não resiste ao mais reles exame empírico de evidências.

A "evidência Niemeyer" sendo, é claro, a primeira que vem à mente.




É sempre chata a onda acrítica de canonização de alguém já absurda e excessivamente consagrado em vida. Mas ainda que haja exagero, ninguém se torna um baluarte sem algum mérito pessoal e histórico acumulado...
Oscar Niemeyer fez muitas obras bem questionáveis, especialmente no fim da vida; mas produziu obras boas, e algumas cuja excelência beira a unanimidade. Não era, enfim, alguém "incapaz" de projetar "algo que prestasse" -- embora um ateu publicamente declarado há décadas.

O mais importante, porém, é isto: se fosse "incapaz" de fazer um bom projeto, certamente não o seria por desacreditar da idéia de uma persona divina. Afinal, os que vêem uma intenção análoga à humana nos movimentos no universo não têm o monopólio da contemplação de sua beleza e complexidade; e, se pensam -- ou dizem -- que têm, é por estarem por demais enredados em seu próprio narcisismo.


Preparem-se!


A maior parte do tempo dos internautas é gasta com poucas coisas: redes sociais, webchat/videoconferências, vídeos, compras online e notícias.  Essas atividades são dominadas por quatro grandes empresas: Facebook, Google/Youtube, Microsoft/Skype e Apple.  E toda pesquisa passa por portais de busca, onde a Google reina só e são feitas a partir de sistemas que podem ser “fixos”, como PCs e laptops e “móveis” (smartphones e tablets) – aí entram, novamente, Microsoft, Google e Apple.

Não adianta mais ter muito cuidado: cada vez que navegamos ou fazemos compras online, empresas como Facebook, Apple e Google estão de olho, coletando dados e analisando nossos gostos e preferências.

Já faz algum tempo que eu me impressiono com a quantidade de produtos que me são oferecidos nessas propagandas que de fato podem me interessar.  A maioria deles, claro, são coisas semelhantes à outras que comprei online: roupas, livros, itens de cozinha, etc.  Esses produtos ficam pipocando nos cantinhos de vários sites que visito, esperando um momento de fraqueza e impulso consumista e, às vezes, aparecem com descontos imperdíveis.

Penso que não tardará muito até que a Google saiba mais sobre os nossos gostos do que nós mesmos.  É possível que, através de algoritmos, descubram relações entre características das coisas que nós compramos nas quais jamais iríamos pensar...por exemplo: Fulano, quando entra online para pesquisar roupas, dá mais atenção (ainda que não compre, necessariamente) a produtos com um certo padrão de cores – gosta de camisetas de cores sóbrias, porém, olha mais para camisetas dessas cores quando o modelo usa uma bermuda de cores mais vivas.  Talvez Fulano nem goste tanto de bermudas de cores vivas, mas por algum motivo, essa característica faz com que ele, inconscientemente, se interesse mais pela camiseta.

É só um exemplo, mas é nesse sentido que caminham as pesquisas sobre o gosto dos consumidores.  Google, Apple e Facebook, coletam uma quantidade absurda de informação sobre cada um de nós; as duas primeiras muito mais, creio, já que estão presentes em praticamente todos os smartphones e tablets do mundo – e ainda temos a Microsoft tá tentando entrar nesse jogo.

Imaginei, outro dia, a seguinte situação: Fulano acorda e tem um entregador da Google Delivery na sua porta, com um pacote.  Você não se lembra de ter comprado nada, e pergunta pro entregador se não há algum engano.

- Engano nenhum, senhor. Esse pacote é seu. Você não comprou, mas sabemos que você o quer.

- Como assim?  Eu não comprei nada, não quero.  Pode ir embora.

- Não quer receber?  Mas já está pago...ou melhor debitaremos hoje o valor no seu cartão de crédito Visa, aquele platinum com vencimento no dia 13.

- Isso é um absurdo!  Um abuso, invasão de privacidade e um crime!  Retire-se com essa merda de pacote, vou contatar as autoridades.

- Senhor, mas é aquela panela francesa que você queria, de ferro fundido esmaltado, a de trinta centímetros.  O produto entrou numa promoção, veio com 35% de desconto e hoje é dia 7, que é o seu dia de fazer compras online.  O senhor costuma comprar no dia 7, já que recebe, provavelmente, no dia 5.  Estamos apenas economizando o seu tempo, já que se encomendasse hoje, levaria mais 3 dias para receber.

- 30%?  Hum... (o sujeito olha pra cima, pensa) – não importa!  Ainda assim é um abuso, um acinte!  Vá logo com esse pacote.

- Tudo bem, senhor.  Ninguém está te obrigando a nada.  Cancelarei agora o débito no seu cartão, tenha um bom dia!

- Ótimo.

O entregador começa a sair, o Fulano fica olhando pra baixo, ainda um pouco indignado, mas certo de que está perdendo uma grande oportunidade.  O entregador já está a uns dez metros quando ouve:

- Qual é a cor?

- Deixa eu ver na nota...laranja senhor.

- Traz logo essa merda aqui!

- Tenha um boa dia, senhor!  E ó: daqui a pouco vai passar “Philadelphia”...o senhor não viu ainda, né?

- Olha só!  Que canal?

- HBO.


Fulano sobe o elevador indignado, desempacotando sua panela nova.  Resolve que vai mesmo assistir o filme, resolve fazer uma pipoca,  Mas não sem antes dar um pulo no facebook.