quinta-feira, 10 de março de 2011

Moacyr Scliar

Pra quem não sabe, morreu, no último 27 de fevereiro, o médico, escritor e cronista gaúcho Moacyr Scliar.  Pra ser honesto, eu não fazia a menor idéia de uma porção de coisas, como, por exemplo, o fato de que ele fazia parte da ABL.  Só o conhecia pelas crônicas semanais na Folha, que ele costumava fazer baseado nas notícias mais esdrúxulas publicadas pelo jornal.  De forma geral, suas crônicas eram sutis, quase ingênuas, daquele tipo de humor que deixa os leitores com um sorrisinho, não às gargalhadas.  Eu estava esperando uma reportagem que fizesse justiça para elaborar um textinho (pretensiosamente) parecido.  Aqui vai:

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Espinhos


Graças à perda de um fragmento de material genético, o homem escapou de ter espinhos no pênis feitos do mesmo material das unhas, a queratina, como têm os chimpanzés e outros mamíferos, como os gatos.
Os espinhos queratinizados aumentam a sensibilidade táctil do pênis e tornam o coito mais rápido, embora possam machucar a fêmea. Para sorte das mulheres, o pênis do homem é liso. Esse tipo de pênis sem "acessórios" costuma estar vinculado a espécies monogâmicas e tende a prolongar a relação sexual, criando um maior vínculo entre os parceiros.
Ciência, 10 de março de 2011

Ludovico e Fátima eram casados há 41 anos.  Ela naquela fase de aproveitar a "melhor idade", participava de cursos de informática, ioga, tricotava e uma vez por ano viajava com um grupo de senhoras para conhecer igrejas antigas.  Ano passado havia estreado a câmera digital que ganhara de seu neto, Ludoviquinho, ou Jonas, como gostava de ser chamado.  Acabou lançando um blog com suas fotos, muito feio mas cheio de comentários dos filhos, netos e sobrinhos.  Ludovico, por outro lado, passava os dias em casa, gritando com a TV quando o noticiário o desagradava e eventualmente fazendo pequenos reparos na casa, que de tão velha e cheia de objetos religiosos, acreditava que podia fazer parte do roteiro das viagens da esposa.  E mais: era tão, mas tão antiquado que tinha espinhos no pênis, fato que incomodava Fátima.

Fátima frequentava os bailes da saudade sozinha, visto que Ludovico não era dado a esse tipo de coisa e nem deixava (lógico!), que a esposa dançasse com outros homens, de forma que ela apenas participava da organização, sempre usando saias longas, pois mulher que se preze não usa calças.

A insatisfação crescente de Fátima acabou em um divórcio.  Em pouco tempo conheceu Haroldo, homem gentil, pouco mais novo que gostava muito de viajar e dançar.  Está muito feliz com o novo romance, e é apoiada por todos os filhos.  Mais ainda, com a descoberta de que Haroldo e a maioria dos homens dos dias de hoje não possuem os incômodos espinhos no pênis.

Ludovico continua só, não arrumou namorada e está pensando em consultar um médico para resolver seu problema.

Marcelo Nakashima
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P.S.  Pra deixar claro, estou patenteando os direitos da expressão "espinhos no pinto.  Seguem algumas sugestões de uso.  Valem também as expressões "espinhos no caralho", "espinhos no pau" e "espinhos na pica".

Mulher conversando com amiga: Acredita que ele disse que me proibia de ir à praia vestindo aquele biquini?
Amiga: Deve ter espinhos no pau.

Pai: Vestida desse jeito você não sai daqui nem morta!
Filha: Ah pai, que saco...parece que tem espinho no pinto...

Mulher traída: Vai enfiar esse pinto cheio de espinhos na puta que te pariu!

Mulher minha não sai de casa sem lavar a louça antes.  Homem que é homem tem espinho no pau.


Por fim, reproduzo a última coluna de Moacy Scliar:

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Lágrimas e testosterona

Atenção, mulheres, está demonstrado pela ciência: chorar é golpe baixo. As lágrimas femininas liberam substâncias, descobriram os cientistas, que abaixam na hora o nível de testosterona do homem que estiver por perto, deixando o sujeito menos agressivo.
Os cientistas queriam ter certeza de que isso acontece em função de alguma molécula liberada -e não, digamos, pela cara de sofrimento feminina, com sua reputação de derrubar até o mais insensível dos durões. Por isso, evitaram que os homens pudessem ver as mulheres chorando. Os cientistas molharam pequenos pedaços de papel em lágrimas de mulher e deixaram que fossem cheirados pelos homens.
O contato com as lágrimas fez a concentração da testosterona deles cair quase 15%, em certo sentido deixando-os menos machões.

Ciência, 7 de janeiro de 2011

ELE VIVIA FURIOSO com a mulher. Por, achava ele, boas razões. Ela era relaxada com a casa, deixava faltar comida na geladeira, não cuidava bem das crianças, gastava demais. Cada vez, porém, que queria repreendê-la por uma dessas coisas, ela começava a chorar. E aí, pronto: ele simplesmente perdia o ânimo, derretia. Acabava desistindo da briga, o que o deixava furioso: afinal, se ele não chamasse a mulher à razão, quem o faria? Mais que isso, não entendia o seu próprio comportamento. Considerava-se um cara durão, detestava gente chorona.
Por que o pranto da mulher o comovia tanto? E comovia-o à distância, inclusive. Muitas vezes ela se trancava no quarto para chorar sozinha, longe dele. E mesmo assim ele se comovia de uma maneira absurda.
Foi então que leu sobre a relação entre lágrimas de mulher e a testosterona, o hormônio masculino. Foi uma verdadeira revelação. Finalmente tinha uma explicação lógica, científica, sobre o que estava acontecendo. As lágrimas diminuíam a testosterona em seu organismo, privando-o da natural agressividade do sexo masculino, transformando-o num cordeirinho.
Uma ideia lhe ocorreu: e se tomasse injeções de testosterona? Era o que o seu irmão mais velho fazia, mas por carência do hormônio.
Com ele conseguiu duas ampolas do hormônio. Seu plano era muito simples: fazer a injeção, esperar alguns dias para que o nível da substância aumentasse em seu organismo e então chamar a esposa à razão.
Decidido, foi à farmácia e pediu ao encarregado que lhe aplicasse a testosterona, mentindo que depois traria a receita. Enquanto isso era feito, ele, de repente, caiu no choro, um choro tão convulso que o homem se assustou: alguma coisa estava acontecendo?
É que eu tenho medo de injeção, ele disse, entre soluços. Pediu desculpas e saiu precipitadamente. Estava voltando para casa. Para a esposa e suas lágrimas.
Moacyr Scliar
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