sexta-feira, 27 de julho de 2007

O diabo veste Nike

Competições do porte de uma Olimpíada, Copa do Mundo e até mesmo os jogos pan-americanos colocam em pauta diversas discussões acerca do esporte e da competitividade humana, em várias escalas.
Por muito tempo, os jogos olímpicos foram utilizados politicamente no jogo de forças entre o mundo capitalista e os comunistas, como propaganda de excelência em esportes, e utilização da comoção provocada pelos resultados dos atletas que representam cada país.
Outro dia li uma reportagem sobre a Suécia, notoriamente um dos países mais prósperos do mundo, tanto economicamente quanto socialmente. Por aquelas bandas, o esporte é visto como fator importante para a qualidade de vida da população, principalmente sob o ponto de vista da saúde. Resultado: anos e anos de investimento na difusão de diversas modalidades fizeram da Suécia uma potência em diversos esportes. Esse investimento todo não teve como finalidade o esporte de alto desempenho, mas sim a difusão do esporte como “coisa saudável”.
Como justificar então, o investimento no esporte de alto rendimento, qual é a importância de medalhas olímpicas para um país?
Simples: o tamanho da indústria dos esportes, das marcas, da mídia e todos os produtos relacionados. Pra exemplificar, pensemos nos esforços brasileiros para entrar no mercado mundial de lançamento de satélites. Esse mercado movimenta cerca de 30 bilhões de dólares por ano, o que o torna muito atraente para qualquer país que seja. Pois bem...o futebol, sozinho, movimenta por ano 250 bilhões de dólares/ano!!!
O esporte no Brasil movimenta 31 bilhões de reais/ano, ou 3,3% do PIB nacional, com 500 mil trabalhadores ligados diretamente ao esporte. É muita coisa, não dá pra ignorar.
Pensando nas leis de mercado, é fácil justificar um boleiro ganhar 50 milhões de dólares por ano...ele gera muito mais dinheiro para a indústria da bola. Se O Milan não oferece o preço de mercado, o Barcelona vai oferecer; se a Adidas não paga, a Nike paga e a adidas deixa de vender milhões em chuteiras e camisetas com a assinatura o tal jogador.
Perguntem aos líderes da República Popular da China se eles tem qualquer intenção de melhorar as condições de trabalho das milhões de crianças que costuram as camisetas Nike. Perguntem se vão tomar qualquer atitude que afaste de seu território as fábricas das grandes indústrias esportivas. Perguntem se não estão investindo uma fábula de dinheiro para realizar as próximas olimpíadas, no ano que vem. E perguntem se não interessa ganhar o maior número de medalhas de ouro possíveis. Perguntem à população de Barcelona se a cidade não melhorou depois da realização das olimpíadas por lá. Perguntem porque uma empresa investe milhões para fazer uma roupa para nadadores que se assemelha à pele do tubarão. Perguntem o que significa para a Speedo um Michael Phelps bater 7 recordes mundiais usando um maiô deles.
Muita, muita grana.
Agora, voltemos para o nosso Pan. Qual é o valor dessa festa toda, da pagação de pau para recordistas que serão fracassos numa olimpíada? É o desenvolvimento no Brasil, de uma indústria que emprega muita gente, e que no final de sua cadeia produtiva - o atleta - , é extremamente democrática. Por mais demagogia que possa estar implícita nisso, esporte é uma boa alternativa para um país tão rico e desigual como o nosso. Esporte educa, promove inclusão social e faz bem pra saúde das nossas crianças e velhinhos.
Por isso tudo, penso que as críticas feitas à toda grana investida no Pan e ao real mérito dos nossos atletas são um pouco e deslocadas do momento e situação apropriados. Esses atletas, desde que mantido o investimento no esporte, podem ser precursores da profissionalização da carreira de esportista. Como questionar o valor de um gari que ganha uma medalha num esporte obscuro, sem qualquer apoio, e tem nesse momento a sua única chance de se tornar notório? O que estaria fazendo o Vanderlei Cordeiro de Lima - o maratonista brasileiro derrubado na maratona das última olimpíadas - se não fosse atleta?
Não é querer que não se investigue o que fizeram com a grana do Pan além das obras, mas o momento de discutir isso e a crueldade das fábricas da Nike na China é qualquer outro que não o meio das competições, entre atletas que se dedicam ao seu esporte tanto quanto qualquer profissional. Vanderlei não tem nada com isso. Assim como os atletas americanos não podem responder pelos desmandos do Bush em cima do pódio, enquanto (não) escutam o hino de seu país.

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3 comentários:

Marcílio, o gêmeo malvado disse...

Postagem ainda contaminada pelo Pan...eu ia comentar tudo isso no post do Gabriel, mas ficou grande demais.

Marcel disse...

Concordo com você Marcelo, e como o conhecido chavão, "assino em baixo"!... Claro que é importante averiguar os devios do emprego de verbas nas obras do PAM e discutir a humanização das fábricas na China, mas rechaçar um evento grande de esportes é ir contra a lógica... Inclusive, nossos torcederores estão muito acostumados ao bom e velho futebol, entretanto, também precisam ir se acostumando com os outros esportes que exigem silêncio e criar mais educação a um desportista que sobe no podium...
Aliás, creio que parcela disso que você falou, se aplica a industria da moda, sempre muito criticada, também...

Marcílio, o gêmeo malvado disse...

É, infelizmente são "bobagens" que movimentam muita grana, e no mundo de hoje em dia...o mesmo se aplica à videogames, programas de TV e tudo que pode ser considerável supérfluo.