terça-feira, 19 de abril de 2016

Contradições de Chico


Depois de mais de um ano esperando uma resposta do Vaticano, a França desiste da indicação de seu embaixador para o país.  O motivo: descobriu-se que Laurent Stefanini é gay.



Pelo que me consta, a função do embaixador é de ordem estritamente diplomática, e não de tentar se casar com algum cardeal - para frustração de alguns destes.

A postura do Vaticano é aparentemente contraditória com as declarações do papa sobre o acolhimento "destas pessoas" pela igreja

"Se uma pessoa é gay, busca Deus e tem boa vontade, quem sou eu para julgá-la?"

Repito o que venho dizendo há algum tempo: nenhuma das posições aparentemente progressistas do papa se converteu em declaração oficial, da espécie considerada  intrinsecamente verdadeira em função da tal infalibilidade papal. Isso só ocorre quando o papa fala "ex cathedra": numa encíclica, por exemplo. Talvez seja necessário papel especial e uma caneta com tinta do Espírito Santo, vai saber.
De qualquer forma, a postura do Vaticano frente ao diplomata gay vai de encontro com o posicionamento do então cardeal Mário Sérgio Bergoglio, que em 2010 escreveu o seguinte sobre o projeto de casamento gay na Argentina:

"O povo argentino deverá confrontar, nas próximas semanas, uma situação cujo resultado poderá ferir gravemente a família. Trata-se do projeto de lei sobre o matrimônio de pessoas do mesmo sexo.
Estão em jogo aqui a identidade e a sobrevivência da família: pai, mãe e filhos. Está em jogo a vida de tantas crianças que serão discriminadas de antecipadamente, privando-se do amadurecimento humano que Deus quis que fosse com um pai e uma mãe. Está em jogo a rejeição direta à lei de Deus, gravada, ademais, nos nossos corações.

Recordo uma frase de Santa Teresinha quando fala sobre sua enfermidade de infância. Disse que a inveja do Demônio quis cobrar em sua família a entrada de sua irmã maior ao convento de Carmelo. Aqui também está a inveja do Demônio, através da qual entrou o pecado no mundo, que de modo arteiro pretende destruir a imagem de Deus: homem e mulher receber o mandato de crescer, multiplicar-se e dominar a terra. Não sejamos ingênuos: não se trata de uma simples luta política. É a pretensão destrutiva ao plano de Deus. Não se trata de um mero projeto legislativo (este é meramente o instrumento), mas de uma 'movida' do pai da mentira que pretende confundir e enganar os filhos de Deus."

A carta original está aqui, em espanhol.
O que é mais provável, pergunto: que entre 2010 e 2013 o papa tenha tido uma epifania e finalmente, revertido sua posição ou que o Vaticano tenha uma preocupação com sua imagem e perda de fiéis?
Nada mudou. Papa e Vaticano continuam contra o casamento gay, o uso de preservativos e sem tomar uma atitude concreta e de escala compatível com os escândalos de pedofilia que atingem sua igreja.
Pra ser justo, algo mudou: o departamento de relações públicas.

Por fim: pra quem é católico e acredita em Deus tal qual colocado pela Igreja Católica, a minha "exigência" de que o papa fale utilizando seus poderes de infalibilidade não pode ser resolvida por vontade do papa Chico, uma vez que depende de vontade divina.  Neste caso, sinto dizer...a única forma de manter a coerência entre a doutrina católica e qualquer posicionamento progressista é acreditar que de fato Deus seja contra o casamento gay e assumir o pecado de concordar com uma posição herege do papa, já que homossexualidade é crime (bem como sexo com qualquer finalidade que não a reprodutiva ou fora do casamento).

Nenhum comentário: