Eu achava, desde o princípio da discussão da candidatura do governo, que essa seria uma campanha vencedora, à despeito das primeiras pesquisas que mostravam Dilma muito atrás de Serra. Tinha plena consciência de que uma vez iniciada a campanha, o Lula seria capaz de transferir um grande contingente de eleitores, o que de fato aconteceu.
Mas uma outra previsão minha se mostrou errada: o que eu conhecia de Dilma, de sua postura firme, impossibilitava ataques baixos como aqueles que o Lula costumava sofrer em suas campanhas. Não seria possível acusar Dilma de ser analfabeta, de falar errado, de desconhecer os números do país, de propor mudanças malucas na economia. Mas não considerei a capacidade de José Serra de derrubar ao chão o nível da campanha e dos debates. O jogo sujo e as campanhas controladas na rédea curta pelos marqueteiros impossibilitaram que Dilma se mostrasse como uma mulher que entende muito da realidade do nosso país. Pra quem nunca viu a Dilma falando com calma, e sem os freios impostos pela publicidade eleitoral, sugiro que vejam essa entrevista (só incluí aqui a primeira parte de seis):
O que aconteceu, todo mundo viu: a campanha tucana começou com os ataques à quebra de sigilo de pessoas ligadas ao Serra - que depois de verificou ser fruto de disputa interna do PSDB.
Seguiu com a utilização do tema aborto, na minha opinião, o maior desserviço da campanha tucana nessa campanha, porque obrigou a Dilma a assumir compromissos com os setores mais conservadores da sociedade brasileira. O tema só saiu de pauta depois da acusação de ex-alunas de Mônica Serra, que relataram que esta teria confessado ter feito um aborto nos EUA.
Na última semana, um tema voltou à tona: a vagabundagem daqueles que recebem o bolsa-família.
O caso relatado por Maria Rita Kehl, no artigo que resultou em sua demissão do Estado de São Paulo, não é novidade pra mim. A jornalista relata o seguinte:
Coincidência ou não, eu ouvi o mesmo caso em Fortaleza. Contado por duas pessoas diferentes, que alegam ter passado pela experiência desagradável de ter suas generosas ofertas de trabalho recusadas por trabalhadores, que abriam mão dos melhores salários para continuar a receber o benefício do bolsa-família. Em uma das histórias, a pessoa recusou a oferta de cara (porque teria ido procurar emprego então)?. No outro caso, a pessoa só recusou depois de saber que o empregador pretendia registrá-la.
Isso, pra mim, simplesmente não tem a menor lógica. Fui me informar direito sobre o funcionamento do bolsa-família, e os fatos são os seguintes:
Famílias com renda de até R$70,00/pessoa, podem receber valores que variam entre R$68,00 a R$200,00 - o valor máximo só é pago para famílias com pelo menos 5 filhos - 3 na faixa etária de até 15 anos e 2 entre 16 e 17 anos. No caso dessas famílias, com renda per capita inferior a R$70,00, o benefício é pago mesmo que não tenham filhos nessas faixas etárias.
Para famílias com renda entre R$70,00 e R$140,00, não existe a possibilidade de receber o benefício sem crianças em idade escolar, e os valores pagos variam entre R$22,00 (1 filho de até 15 anos na escola) a R$132,00 (5 filhos).
As tabelas com os valores pagos e condições impostas, podem ser encontradas aqui.
Vamos raciocinar um pouco: se a pessoa sai de casa para procurar emprego, supõe-se que ela queira trabalhar. Digamos que essa pessoa faça parte de uma família cuja renda não supere os R$70,00/pessoa, e que o benefício recebido seja o máximo: pai, mãe, três filhos entre 0 e 15 anos dois entre 16 e 17. São 7 pessoas com renda inferior a R$490,00 - menos que 1 salário mínimo - R$510,00.
É legítimo que uma pessoa numa situação dessas recuse um emprego que pague R$510,00 para uma jornada de 44 horas/semana. Não há dignidade e, de fato, é melhor que essa pessoa fique em casa cuidando de seus filhos. Mas digamos que o salário oferecido seja maior que esse. Nos dois casos que me foram relatados, ofereciam R$700,00 e R$900,00.
Com R$900,00, a renda per capita da família passa a ser de R$128,57/pessoa, o que ainda qualifica a família a receber um benefício de R$132,00. Faz sentido alguém abrir mão de uma renda familiar de R$1.032,00 para continuar recebendo R$200,00 do governo???
Todas as vezes que questionei meus interlocutores a respeito da falta de lógica dessa situação, recebi respostas do tipo "é que esse povo fica acomodado com isso" ou "são burros, não fazem esse raciocínio". São, invariavelmente argumentos preconceituosos, pronunciados em tom de extremo desdém e denotam, na minha opinião, um profundo desrespeito à familias humildes que passam fome.
Penso, honestamente, que pra quem já fazia parte da classe média antes de Lula, o valor que o governo gastou no bolsa-família não faz a menor diferença. Foram destinados ao bolsa-família, entre 2003 e 2010, R$60,2 bilhões de reais, ou R$7,5 bilhões/ano, o que equivale a 0,23% do PIB de 2009 (R$3.143 bilhões). Esse "pequeno investimento", significou um acréscimo de 47% na renda das cerca de 50 milhões de pessoas atendidas em todos os municípios brasileiros, cerca de 26% de toda a população. As informações estão aqui.
O bolsa-família é um programa de carácter emergencial, e na minha avaliação, tem dois objetivos: evitar que milhões passem fome (coisa muito abstrata para as elites, muito concreta para quem vive assim), e colocar a opção de manter as crianças na escola como escolha melhor que mandar os filhos para a rua, vender balas. Esse programa não é, de forma alguma, responsável pela elevação dos milhões de brasileiros que ascenderam à classe média. Isso é fruto da política de reajustes constantes no salário mínimo e do crescimento econômico que gerou 15 milhões de emprego nos últimos 8 anos.
Falar contra o bolsa-família é perverso. Acusar os famintos deste país - colocados nessa condição por conta de 500 anos de dominio das elites brasileiras e ausência de políticas sociais - de vagabundagem é maldade, falta de sensibilidade. E alegar "que a burrice do povão" os leva a recusar melhores condições de vida, especialmente daqueles que estão procurando emprego, é um insulto à inteligência de qualquer cidadão - estamos falando de pessoas, e mesmo ratos são capazes de apertar os botões que lhes retribuam com a melhor recompensa.
De qualquer forma, esse dicurso não me impressiona. A mesma estratégia foi adotada na ocasião em que derrubaram a CPMF. As mesmas elites que falam contra o bolsa-família, foram responsáveis pelo entendimento, de grande parte da classe média do Brasil, de que os 0,38% pagos sobre as movimentações financeiras representavam alguma coisa relevante nos bolsos da população. Uma pessoa que movimentasse R$5 mil/mês (quantas pessoas movimentam isso no Brasil?), pagaria R$17,00/mês. Em nome do fim desse "abuso", a saúde do país perdeu R$40 bilhões/ano - ou 5,5 vezes mais o que se investe no bolsa-família.
Triste.
"Uma dessas correntes (de e-mail) chegou à minha caixa postal vinda de diversos destinatários. Reproduzia a denúncia feita por “uma prima” do autor, residente em Fortaleza. A denunciante, indignada com a indolência dos trabalhadores não qualificados de sua cidade, queixava-se de que ninguém mais queria ocupar a vaga de porteiro do prédio onde mora. Os candidatos naturais ao emprego preferiam viver na moleza, com o dinheiro da Bolsa-Família."
Coincidência ou não, eu ouvi o mesmo caso em Fortaleza. Contado por duas pessoas diferentes, que alegam ter passado pela experiência desagradável de ter suas generosas ofertas de trabalho recusadas por trabalhadores, que abriam mão dos melhores salários para continuar a receber o benefício do bolsa-família. Em uma das histórias, a pessoa recusou a oferta de cara (porque teria ido procurar emprego então)?. No outro caso, a pessoa só recusou depois de saber que o empregador pretendia registrá-la.
Isso, pra mim, simplesmente não tem a menor lógica. Fui me informar direito sobre o funcionamento do bolsa-família, e os fatos são os seguintes:
Famílias com renda de até R$70,00/pessoa, podem receber valores que variam entre R$68,00 a R$200,00 - o valor máximo só é pago para famílias com pelo menos 5 filhos - 3 na faixa etária de até 15 anos e 2 entre 16 e 17 anos. No caso dessas famílias, com renda per capita inferior a R$70,00, o benefício é pago mesmo que não tenham filhos nessas faixas etárias.
Para famílias com renda entre R$70,00 e R$140,00, não existe a possibilidade de receber o benefício sem crianças em idade escolar, e os valores pagos variam entre R$22,00 (1 filho de até 15 anos na escola) a R$132,00 (5 filhos).
As tabelas com os valores pagos e condições impostas, podem ser encontradas aqui.
Vamos raciocinar um pouco: se a pessoa sai de casa para procurar emprego, supõe-se que ela queira trabalhar. Digamos que essa pessoa faça parte de uma família cuja renda não supere os R$70,00/pessoa, e que o benefício recebido seja o máximo: pai, mãe, três filhos entre 0 e 15 anos dois entre 16 e 17. São 7 pessoas com renda inferior a R$490,00 - menos que 1 salário mínimo - R$510,00.
É legítimo que uma pessoa numa situação dessas recuse um emprego que pague R$510,00 para uma jornada de 44 horas/semana. Não há dignidade e, de fato, é melhor que essa pessoa fique em casa cuidando de seus filhos. Mas digamos que o salário oferecido seja maior que esse. Nos dois casos que me foram relatados, ofereciam R$700,00 e R$900,00.
Com R$900,00, a renda per capita da família passa a ser de R$128,57/pessoa, o que ainda qualifica a família a receber um benefício de R$132,00. Faz sentido alguém abrir mão de uma renda familiar de R$1.032,00 para continuar recebendo R$200,00 do governo???
Todas as vezes que questionei meus interlocutores a respeito da falta de lógica dessa situação, recebi respostas do tipo "é que esse povo fica acomodado com isso" ou "são burros, não fazem esse raciocínio". São, invariavelmente argumentos preconceituosos, pronunciados em tom de extremo desdém e denotam, na minha opinião, um profundo desrespeito à familias humildes que passam fome.
Penso, honestamente, que pra quem já fazia parte da classe média antes de Lula, o valor que o governo gastou no bolsa-família não faz a menor diferença. Foram destinados ao bolsa-família, entre 2003 e 2010, R$60,2 bilhões de reais, ou R$7,5 bilhões/ano, o que equivale a 0,23% do PIB de 2009 (R$3.143 bilhões). Esse "pequeno investimento", significou um acréscimo de 47% na renda das cerca de 50 milhões de pessoas atendidas em todos os municípios brasileiros, cerca de 26% de toda a população. As informações estão aqui.
O bolsa-família é um programa de carácter emergencial, e na minha avaliação, tem dois objetivos: evitar que milhões passem fome (coisa muito abstrata para as elites, muito concreta para quem vive assim), e colocar a opção de manter as crianças na escola como escolha melhor que mandar os filhos para a rua, vender balas. Esse programa não é, de forma alguma, responsável pela elevação dos milhões de brasileiros que ascenderam à classe média. Isso é fruto da política de reajustes constantes no salário mínimo e do crescimento econômico que gerou 15 milhões de emprego nos últimos 8 anos.
Falar contra o bolsa-família é perverso. Acusar os famintos deste país - colocados nessa condição por conta de 500 anos de dominio das elites brasileiras e ausência de políticas sociais - de vagabundagem é maldade, falta de sensibilidade. E alegar "que a burrice do povão" os leva a recusar melhores condições de vida, especialmente daqueles que estão procurando emprego, é um insulto à inteligência de qualquer cidadão - estamos falando de pessoas, e mesmo ratos são capazes de apertar os botões que lhes retribuam com a melhor recompensa.
De qualquer forma, esse dicurso não me impressiona. A mesma estratégia foi adotada na ocasião em que derrubaram a CPMF. As mesmas elites que falam contra o bolsa-família, foram responsáveis pelo entendimento, de grande parte da classe média do Brasil, de que os 0,38% pagos sobre as movimentações financeiras representavam alguma coisa relevante nos bolsos da população. Uma pessoa que movimentasse R$5 mil/mês (quantas pessoas movimentam isso no Brasil?), pagaria R$17,00/mês. Em nome do fim desse "abuso", a saúde do país perdeu R$40 bilhões/ano - ou 5,5 vezes mais o que se investe no bolsa-família.
Triste.
14 comentários:
Não digo que a história dos "vagabundos do bolsa-família" seja invenção cearense...e se for dane-se, os setores reacionários da sociedade inventam essas coisas em qualquer lugar. Mas a Maria Rita Kehl recebeu essa história esse ano, e, salvo engano, escutei essa balela pela primeira vez em 2007, oralmente, em Fortaleza.
Ótimo texto, Marcelo.
Duas semanas atrás eu escutei um conjunto parecido de coisas escabrosas -- mas mais extenso, não especificamente sobre bolsa-família. O conjunto incluía racismo explícito, e ainda vou narrá-lo aqui quando tiver mais tempo.
Estou me remoendo de raiva e incredulidade até agora com aquela discussão, e ela me deixou com uma ansiedade maior em ver logo a Dilma eleita e Serra fora da política por 4 anos.
O tom dessa campanha está absurdamente baixo (dos dois lados agora) e torna-se insuportável. Só quero ver isso acabar.
Você chegou a ler um texto de um cara chamado Ricardo Lins Horta, que o Idelber publicou no blog dele? Pra mim, foi o mais completo apanhado de dados comparativos entre os governos petista e tucano, e é pra tirar a dúvida de qualquer um. http://www.idelberavelar.com/archives/2010/10/para_voce_eleitor_indeciso_por_ricardo_lins_horta.php
Li sim o texto do Ricardo Lins Horta, já repassei e utilizei, tá muito completo mesmo.
A campanha de fato tá muito suja, a ponto de me dar dor de cabeça nos fins de quase todos os dias, quando faço um apanhadão dos fatos.
Espero, como você, que acabe logo. E acho que o Serra não fica 4 anos foram. Com Geraldo no governo e o Aécio no meio do mandato do senado, creio que ele volte a concorrer - e possivelmente leva - a prefeitura daqui.
Prezado Marcelo. Aqui é o Pinha, nos conhecemos no Rio. Já vou me identificar já, sou eleitor do Serra. E concordo com o óbvio, o nível da campanha é lamentavelmente baixo.
A campanha da Dilma também faz uso da mentira ao comentar sobre as privatizações ex: a Vale foi "entregue" por 4 bilhões e hj vale 70. Ela omite que 4 bi eram apenas 40% do capital da empresa. E que de lá até hoje o valor do IBOVESPA se multiplicou por 5. O preço da época foi justo para a situação da empresa e do Brasil na época. De lá pra cá a Vale se internacionalizou, comprou ativos no exterior e traz divisas ao país pagando, se não me engano, 5 bilhões em imposto de renda no ano passado, dinheiro que com certeza faz diferença ao orçamento nacional e aos programas sociais.
Aqui artigo sobre isso http://rodrigoconstantino.blogspot.com/2010/10/privatizacao-da-vale.html
e outro sobre um caso de mais sucesso ainda, a Embraer http://rodrigoconstantino.blogspot.com/2010/10/nas-asas-do-sucesso.html
Abraço, Pinha
Caro Marcílio,
creio que você está prestando um grande serviço com este artigo ao contra-argumentar a esta visão preconceituosa quanto ao Programa Bolsa Família. Eu trabalho no Programa e vivencio no dia-a-dia alguns desses relatos. Eventualmente aparece na rede "denúncias" desta natureza. Agora eu fico com uma pergunta, será que essas pessoas que ouvem e repercutem este tipo de "denúncia" algum dia pararam para conversar com alguns beneficiários do PBF? Já tentaram acessar informações sobre o programa para entender melhor como funciona (como você exemplarmente fez)? abs.
Nos conhecemos daquele almoço com o Gabriel e a Dani? Sou péssimos com nomes...
Em primeiro lugar, agradeço o comentário e elogio a sua postura de buscar o debate aberto e limpo por aqui, é sempre difícil argumentar em ambientes hostis às nossas posições políticas. Eu acompanho política há algum tempo, de forma que já não tenho dedos nas minhas críticas ao Serra, mas respeito as posições de quem vote nele.
Não sei de quem é a frase, mas dizem por aí que "estatística é a arte de torturar os números até que eles confessem".
Mentir com números, infelizmente, acontece em qualquer campanha, e não só no Brasil. O governo infla dados a seu favor, como o Serra mostra um estado de São Paulo que me causa profunda estranheza, especialmente quando fala de estradas, metrô e educação.
Ataques aos modelos de governo propostos também são legítimos, e uma das dificuldades do Serra nessa campanha é justamente essa: como bater num governo extremamente popular como o de Lula? Dessa forma, acho legítimo que a campanha da Dilma faça o jogo de comparação com a gestão FHC -faz parte do debate político e não há baixaria em se comparar dois períodos da nossa história recente. Caso nosso ex-presidente tivesse saído do cargo com 83% de aprovação, certamente Serra teria se utilizado desse fato - capital político não se joga fora (aqui em São Paulo ainda utilizam a imagem de Mário Covas).
Acho que uma coisa é certa: cabe a quem está perdendo atacar. A priori, a campanha da Dilma poderia ter sido feita simplesmente na base da "celebração do momento atual". Já o Serra, obviamente precisava atacar alguma coisa, e acho que, infelizmente, partiu para o jogo sujo - o que levou a campanha petista a também se colocar na ofensiva.
O que eu considero baixaria do Serra é, por exemplo, ter trazido o tema do aborto para o debate. na minha opinião, ao procurar saídas que não fossem atacar o governo Lula, Serra se aliou com o que há de pior na sociedade brasileira: setores conservadores de ultra-direita, religiosos fanáticos e por aí vai. Pior que isso: duvido que o Serra seja contra a descriminalização do aborto (Dilma também não é), mas ao tornar esse um tema central da campanha, obriga todos os candidatos a se posicionarem, de forma hipócrita ou não.
Quanto às privatizações, eu não penso que o Estado deva ter participação em todos os setores da economia. Dessa forma, não vejo problema nas privatizações da telefonia ou da Embraer. Não é função do Estado construir avião. Já o caso da Vale, na minha opinião, é diferente:
A Vale explora recursos minerais que, na minha opinião, pertencem à nação. A Petrobrás também. Os dados no artigo que você recomendou estão corretos, e a Vale teve uma grande valorização desde que foi vendida. Mas a Petrobrás também teve, sem ser. Você (se for quem eu penso que é...rsrsrs!) trabalha na empresa, e o que eu ouço de quem está aí dentro é que houve uma grande melhora das condições de trabalho.
Isso pra mim é um avanço óbvio: uma empresa que detenha como capital reservas minerais de um país do tamanho do Brasil, não pode se dar mal. Só com má vontade mesmo. A Petrobrás, com a descoberta do pré-sal se transforma em uma coisa muito diferente do que tínhamos antes. A Vale não.
Aqui na USP, o pessoal da Geologia e da Geografia Física (minha área) estimam que o valor do patrimônio mineral a ser explorado (petróleo à parte)está na casa dos trilhões de dólares. Não sei se isso confere, mas não é difícil deduzir que num país desse tamanho tenha resrevas minerais proporcionalmente grandes, afinal, todo esse monte de rocha e solo é feito de minerais!
Não gosto da tese do Estado-mínimo. Na minha opinião, o Estado deve sim intervir na economia visando corrigir distorções do mercado. Aliás, a grave crise financeira mundial foi provocada, principalmente, pela falta de regulamentação dos mercados financeiros...porque a "mão invisível" não enxerga classes sociais, justiça, e essas coisas tão "abstratas" que fazem diferença para tanta gente. Bom, quando a coisa apertou, lá se foram os EUA com um plano de salvamento de quase 1 trilhão de dólares!
Por outro lado, penso que não é papel do governo ter empresas para gerar "lucro". O aparato do Estado deve ser utilizado para benefício da população. Quer um exemplo bobo? Em quase todas as grandes cidades do mundo os sistemas de metrô são deficitários, e portanto, subsidiados pelas administrações locais. Metrô não serve pra dar lucro, é um serviço básico e deve ser garantido, como condição de qualidade de vida urbana.
Da mesma forma, penso que recursos advindos de patrimônio nacional (reservas minerais) devam ser utilizados em benefício do país. Por isso, penso que a Vale não deveria ter sido vendida, sendo o preço pago justo ou não - e volto na questão de que a Vale podia, com administração competente, ser lucrativa sob tutela estatal, como é a Petrobrás.
Bom, é isso aí. Agradeço novamente pela intervenção, abração!
Caro Franco,
quem me dera esses escritos tivessem algum alcance significativo. Acho que essas coisas que eu coloquei aqui ser ditas pela grande imprensa, já que esse tipo de visão preconceituosa não é tão difícil de detectar. Ocorre que infelizmente (e especialmente em anos eleitorais) existem interesses políticos que contaminam a imprensa - como eu disse, a Maria Rita Kehl foi demitida do Estadão por ter escrito algo parecido com isso.
Como eu acredito que aos poucos (embora mais rápido do que antes) o país vem melhorando, chegaremos numa sociedade mais plural e atenta à origem dos fatos que conhece. Blogs políticos são fonte de informação e debate em países mais desenvolvidos. Nós temos uma grande variedade de bons blogs, mas o acesso ainda é muito restrito.
O teu depoimento aqui é muito importante, uma vez que você trabalha no programa. Imagino o clima de consternação que deva rolar por aí quando aparecem relatos desse tipo - não são exclusividade da elite cearense, eu já escutei outros tipos de bobagens aqui em São paulo e no Paraná, onde morava.
Via de regra, denuncistas do bolsa-família não tem a menor idéia de como funciona o programa, pra que serve, quem são os beneficiários e o que significa um incremento de R$90,00 na renda de quem não tem o que comer.
Eu disse, no texto, que o bolsa-família não tem como resultado direto o crescimento econômico, mais alavancado pela política do salário mínimo e pelo crescimento do país, mas uma colega me lembrou hoje à tarde que, dinheiro recebido por essas famílias acaba caindo direto na economia local.
O mesmo raciocínio é válido para o salário mínimo: como é impossível poupar dinheiro quando se receber R$510,00, um reajuste para R$550,00 significa dinheiro entrando diretamente no consumo. Se fosse R$1.000,00, ainda seria assim.
Certamente existem casos de gente se apropriando indevidamente de recursos do bolsa-família, mas ainda assim, o custo do programa é tão baixo para um benefício tão grande e necessário, que isso se torna irrelevante. Investiga-se, pune-se e pronto. Nada disso justifica a não existência do programa.
Obrigado pela colaboração, abração!
Opa Marcelo,
Gostei do texto e você sintetizou e explicou bem o que já vinha pensando e inclusive foram responsáveis por uma das discussões mais acaloradas que tive nos últimos tempos.
Não é segredo que temos, digamos, uma macro visão política afinada, só discordando em questões mais especificas.
Enfim, as questões das privatizações são complexas mesmos. Primeiramente, vivemos, de um jeito ou de outro, em um país capitalista que visa minimizar o rigor do capitalismo puro através do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, em uma evolução do Estado do Bem Estar Social para o Estado Democrático de Direito.
Bom, de qualquer forma, como dito, em um sistema capitalista, digamos, mitigado pelos direitos sociais constitucionalmente garantidos.
Não obstante, neste estado deve haver privatizações do que não for essencial para o Estado garantir esta dignidade da pessoa humana, que depende de serviços básicos, como o tripé da sociedade, saúde, educação e segurança. Além de adendos como energia, meio ambiente equilibrado, etc...
Peguemos a matriz energética, dentro dela pode se entender como tudo o que gera energia, como o petróleo.
Da mesma forma, tudo o que estiver no solo brasileiro, pertence ao Estado e deveria ser explorado primordialmente por este.
Para isto existe a figura jurídica da empresa estatal de direito privado também a de economia mista.
Um ponto que vi em uns dos debates e o Serra acusou o PT de ter privatizado foi o Banco do Brasil.
Foi falacioso ao extremo.
Primeiramente, porque o BB é uma Sociedade de Economia Mista, onde a maior parte do capital deve ser do Estado (51% do capital votante no caso) e o resto é aberto para acionistas e investidores.
O Serra afirmou, salvo engano, que o PT colocou ações do Banco do Brasil na Bolsa de Valores norte Americana.
Pois bem, isto foi realmente feito, mas relativo a parte que pela própria natureza jurídica de uma Sociedade de Economia Mista permite, mantendo-se a maioria do capital votante e na prática não alterando nada.
Isso é necessário em qualquer empresa que tenha capital aberto para alavancar os valores das ações e capitalizar um maior lucro e valores para a empresa.
Então, o que o PT fez não foi privatizar, vez que o B.B em sua essência é uma Empresa de Ecônomia Mista que tem parte do capital privado e parte público.
Em resumo, voto na Dilma!
Caro Marcelo, sou eu mesmo do almoço com a Dani e Gabriel.
Gostei muito da sua resposta e digo que concordo em quase todas as suas colocações. Eu lamento que o Serra tenha usado golpes tão baixos pra tentar reverter o jogo, fico com vergonha. E apontar equívocos grosseiros de ambas as partes nessa disputa é fácil. O que mais me preocupa na visão de estado da Dilma é esse viés estatizante. Isso já pode ser percebido em algumas ações recentes do governo como a capitalização da Petrobras, que aliás foi um sucesso. Só que o governo aproveitou para elevar sua participação na empresa, que era de 51% do capital votante e 34% do capital total, para 42% do capital total. Ou seja, se o governo já controla a empresa não vejo motivos para querer ter ainda mais ações.
E analisando a situações atual de empresas públicas como a Infraero e Correios, completamente loteadas à "aliados", fico muito preocupado com o futuro da administração federal.
Grande abraço,Pinha
Fala Pinha,
Então minha memória não me traiu, é você mesmo. Como andam as coisas por aí?
Eu não tenho como te responder osbre os motivos pelos quais o governo resolveu aumentar sua participação na Petrobrás. Apenas desconfio que tenha alguma coisa a ver com uma ação estratégica e política. Como a tendência da petrobrás é de valorização, 0o governo pode ter optado por um investimento seguro, já que dólar a gente tem comprado adoidado, por conta da desvalorização da moeda americana. E a outra possível explicação, seria na linha do que eu argumentei anteriormente: petróleo e minerais são tratados, por este governo, como reservas estratégicas. Ou seja, não posso te responder, mas em política, dificilmente se dá ponto sem nó - e no que se refere à valorização da Petrobrás, considero que esse governo tenha sido bem sucedido.
Quanto ao viés estatizante, não sei se é bem assim. Que outras empresas tiveram aumento de controle do governo federal? Que eu saiba, somente aquelas nas áreas em que a iniciativa privada vinha falhando: energia elétrica - e internet, já que por motivos de mercado, as empresas simplesmente não expandiram suas redes para os pequenos municípios do Norte e Centro-Oeste.
Quanto ao aparelhamento do estado, sugiro a leitura do tópico 1 do seguinte texto:
http://www.idelberavelar.com/archives/2010/10/para_voce_eleitor_indeciso_por_ricardo_lins_horta.php
É isso aí. Espero que, qualquer que seja o resultado, o país siga melhorando.
Obrigado pelos comentários, tem sido muito difícil debater com gente razoável nessa campanha.
Abração!
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